São Paulo, domingo, 24 de dezembro de 1995
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Para advogados, lei dificulta punição

MILTON GAMEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Os crimes do colarinho branco, previstos pela lei 7.492/92, nunca dão cadeia no Brasil. Ao contrário do que acontece nos Estados Unidos, quem comete irregularidades no mercado financeiro nacional acaba escapando ileso, reclama Otto Steiner Júnior, diretor-jurídico da Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos).
"Não defendemos a impunidade. Mas, com o atual o arcabouço legal e o despreparo dos promotores públicos, não dá para punir quem faz coisa errada no mercado financeiro", diz Steiner Jr..
Segundo ele, a Lei do Colarinho Branco é muito genérica, o que dificulta a penalização dos criminosos e diminui o direito de defesa dos acusados. A lei condena, por exemplo, quem fizer uma "gestão temerária" de instituição financeira (artigo 4º, parágrafo único). A pena, nesse caso, vai de dois a oito anos de prisão, além de multa.
"O que é gestão temerária? É um conceito muito vago. Descasar (usar prazos diferentes) ativos e passivos pode resultar na quebra de um banco, mas nem sempre isso é gestão temerária. Às vezes é imposição do mercado ou do governo", afirma. "O Banco Central obriga os bancos a captar dinheiro na poupança, por prazo de trinta dias, e financiar a casa própria, com esse dinheiro, por quinze anos", exemplifica.
Além da generalidade da lei, facilita a vida dos criminosos o despreparo dos procuradores do Ministério Público, que nunca conseguem pôr no papel, de forma convincente, os crimes cometidos no mercado financeiro, acrescenta o diretor da Febraban.
Nos Estados Unidos, há procuradores especializados, capazes de destrinchar os meandros das operações financeiras mais complexas. Tanto é que o megaespeculador Michael Milken, o rei dos "junk bonds" (títulos de alto risco), pegou dez anos de cadeia e foi obrigado a pagar multas da ordem de US$ 500 milhões.
O advogado Márcio Thomaz Bastos, especialista no tema, também reclama da lei 7.942, formulada há dez anos.
"É uma lei absurda. Temos de reformar esse monstrengo. As penas são desproporcionais, chegam a 12 anos. Se fossem mais curtas e irrecorríveis, seriam mais eficazes", diz Bastos.
Ele tem clientes que sofreram prejuízos em operações de "day trade" (abertas e fechadas no mesmo dia, nas Bolsas de valores e de futuros) e estão sendo processados por gestão temerária.
"Esse conceito é muito amplo. Não se pode fazer um mal negócio, se o mercado assim o exigir? O Código Penal dá nome aos crimes -matar, roubar, fraudar-, mas a Lei do Colarinho Branco é muito arbitrária", reclama.
Para o BC, gestão temerária é sofrer prejuízos financeiros -não de vez em quando, mas sistematicamente, afirma o delegado interino do BC, Virgínio Santos Neto.
(MG)

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