São Paulo, quinta-feira, 28 de dezembro de 1995
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Polloni deixa para o teatro modelo de administração e produção artística

MAURÍCIO PARONI DE CASTRO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O desaparecimento do ator e produtor Sandro Polloni tem o significado de um ponto final na saga de uma capacidade inerente e vital ao teatro, que está morrendo aos poucos: herdar e criticar, para depois desenvolver, um modelo próprio de produção.
Sandro Polloni era um "figlio d'arte" (define-se assim quem encontra o teatro cedo e na própria família). Nasceu em 1920 na São Paulo das filodramáticas, círculos culturais italianos que promoviam um teatro amador, em italiano, de inspiração tradicional. Daqui surgiu Italia Fausta, atriz e diva inteligente que aliou esse "divinismo" e narcisismo do ítalo-brasileiro em ascensão a um repertório trágico de alto nível, tendo Eleonora Duse como modelo.
Italia Fausta era tia de Polloni, e com ela vai ao Rio, desenvolve-se com "os comediantes" (balão de ensaio do movimento renovador praticado pelo Teatro Brasileiro de Comédia), entra em contato com intelectuais, diretores e dramaturgos modernos como Nelson Rodrigues, então em começo de carreira teatral. Forja uma noção de organização de teatro muito parecida com a noção italiana: uma profissionalidade econômica em que o interesse artístico é mediado pela administração do público, traduzido em bilheteria (no Brasil) e em política (na Itália).
Encontrando Maria della Costa, atriz de coragem e dignidade do nível de Italia Fausta, completa-se o seu projeto; com ela constrói o teatro que leva o seu nome e contrata na Itália o então cenógrafo Gianni Ratto (depois encenador) para ser seu diretor artístico.
A guilhotina do governo militar põe fim ao projeto, o teatro é vendido, mas a sua mentalidade empresarial continua. Descobre Parati. Sempre com Maria, constrói um hotel que foi o responsável pela descoberta da importância cultural da cidade para os brasileiros.
Com um organizador desse nível, qualquer jovem diretor teria a sua formação profissional facilitada. Com Polloni, era-se contraposto a uma figura que traduzia a preocupação estética em realidade administrativa e não simplesmente comercial. O diretor aprendia na marra a ser responsável. Para criticar outra produção, fazia uma nova, e depois a defendia aplaudindo, fiel à sua tradição.
Sandro Polloni deixa um legado teatral que hoje serve, no mínimo, como ponto de referência para a insatisfação produtiva dos diretores e para o desespero dos produtores do teatro e seu "business" (basta abstrair possíveis ideologias). Não é pouco.

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