São Paulo, quarta-feira, 1 de fevereiro de 1995
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Penn antecipa o espírito de 68

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Sessão corrida de gângsteres e similares. Primeiro, "Horas de Desespero", versão Michael Cimino (Bandeirantes, 22h). Depois, "Uma Rajada de Balas", vulgo "Bonnie and Clyde", de Arthur Penn (Globo, 0h).
E, se "Horas de Desespero" não é o melhor Cimino, tem a mão de um dos cineastas hollywoodianos mais irredutíveis do momento. E tem Mickey Rourke, um ator que só dá certo em filmes de Cimino.
Existe, por fim, uma ironia na observação do confronto entre o universo familiar (a casa invadida pelo gângster) e o do próprio criminoso, através do qual a questão dos valores se deixa pensar quase de forma geográfica (o que são, quais são, mas também: onde eles estão?).
Com "Uma Rajada de Balas", estamos no domínio do clássico moderno. Poucas vezes a secura de Penn encontrou um assunto tão a caráter para se exercitar.
O casal de marginais da era da Depressão (Dunaway e Beatty) que desafia a lei e a ordem mais como atitude existencial do que por outras razões é um dos filmes modelares do espírito de 68.
Mas, se o tempo passou, o filme ficou. O que Penn tem de seco tem também de exato, na construção dos personagens, no desenvolvimento da intriga. E, sobretudo, na capacidade de evitar qualquer demagogia social em torno do assunto. Paradoxalmente, essa última qualidade é um dos motivos que fazem deste filme um clássico: em vez de denunciar, trata-se de notar a iniquidade das relações sociais; em vez de discursar, mostra.

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