São Paulo, domingo, 12 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O custo do almoço

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO — Recebo duas opiniões opostas a respeito da coluna de quinta-feira, na qual estranhava o fato de que o Plano Real parece contrariar a velha teoria segundo a qual "não há almoço grátis". É alusão ao fato de que, após a introdução da nova moeda, setor algum parece ter perdido algo.
José Roberto Mendonça de Barros, secretário de Política Econômica da Fazenda, diz que alguns ajustes importantes (e com custos) já haviam sido feitos antes da entrada em vigor do real e até antes da URV, sua predecessora.
Cita: o acerto da dívida externa, conta que estava pendente há 12 anos; a abertura da economia, que fez aumentar a competição e alterou um padrão de protecionismo de 50 anos; uma razoável abertura financeira, que permite aos brasileiros comprar dólares livremente para viajar, por exemplo.
E, talvez mais importante, o enxugamento do setor privado, que "se tornou mais leve e mais ágil, mas ao custo de uma brutal recessão em 1991", diz Mendonça de Barros.
Já Antônio Corrêa de Lacerda, presidente do Conselho Regional de Economia, prefere apontar outro tipo de custo: "Uma brutal transferência de renda em favor do sistema financeiro e dos credores do governo de modo geral, inclusive os titulares de caderneta de poupança, já que esta paga juros de cerca de 3% ao mês para uma inflação próxima de 1%".
Lacerda diz que a sobrevalorização do real, acompanhada de juros "na lua", cria uma "situação absolutamente artificial". Para ele, o sucesso do plano até agora apóia-se, sim, em uma "mágica", embora "tecnicamente perfeita", qual seja a quebra da inflação inercial por meio da URV.
Mas, sem reformas estruturais, o economista vê tremendos custos à frente, na forma de desindustrialização e crise cambial.
Mendonça de Barros reconhece a necessidade de ajustar também o setor público, mas não imagina uma catástrofe à frente, mesmo que o ajuste seja insuficiente. Limita-se a dizer que "a qualidade do programa fica pior".
Comprova-se, com o debate indireto, que não há, de fato, "almoço grátis". Mas só o tempo dirá quem vai pagar a conta.

Texto Anterior: Reabilitar as prisões
Próximo Texto: A lenda do vento
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.