São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 1995
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Fellini retrata morte em filme não-realizado

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Mais de um ano depois da morte de Federico Fellini (1920-93), vem à luz o roteiro daquela que seria, segundo a própria expressão do cineasta, sua "obra-testamento". A editora italiana Bompiani lançou na semana passada o script do filme jamais realizado "Il Viaggio di G. Mastorna".
Escrito por Fellini em colaboração com o escritor Dino Buzzati entre 1965 e 1966, "Il Viaggio di G. Mastorna" deveria ser o filme que o diretor faria logo após "Julieta dos Espíritos" (1965).
Fellini atravessava então uma profunda crise. O semifracasso de "Julieta" o levara a se afastar do produtor Angelo Rizzoli e de seus colaboradores habituais. Além disso, estava abalado pela morte do analista e amigo Ernst Bernhard.
Foi nesse contexto que o produtor Dino De Laurentiis seduziu Fellini a trabalhar com ele. O diretor ofereceu-lhe inicialmente o projeto de um filme de ficção científica inspirado no livro "What Mad Universe", de Frederic Brown.
Quando Fellini mostrou-lhe seu argumento, entretanto, De Laurentiis viu que não sobrava nada do livro original e que se tratava de um filme sobre a morte (leia texto abaixo). Considerou o tema funesto e aziago, e ficou com o pé atrás.
Os desentendimentos entre produtor e diretor, somados a uma imprevista doença deste último em 1967, acabaram por determinar o abandono do projeto.
Vários atores tinham sido cogitados para o papel de Mastorna. O mais óbvio era Marcello Mastroianni: dizia-se que Mastorna era uma contração de "Mastroianni ritorna", mas Fellini negava. Outros nomes aventados: Ugo Tognazzi, Paul Newman, Laurence Olivier, Gregory Peck...
Para Tullio Kezich, biógrafo do cineasta e autor do prefácio de "Il Viaggio di G. Mastorna", o contínuo regresso de Fellini ao roteiro comprova que ele mantinha a disposição de filmá-lo um dia. De fato, em entrevistas concedidas em momentos diversos de sua carreira o diretor se referia a "Mastorna" como um projeto a ser realizado "num segundo momento".
Em "Fellini, uma Biografia", Kezich sugere que o cineasta procurava pretextos para adiar a realização do filme por considerá-lo supersticiosamente um fecho de sua obra e de sua vida: "Talvez a insatisfação de Federico se deva ao fato de ter encontrado, quando quer continuar buscando".

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