São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 1995
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Economistas culpam as margens de lucro

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O fator preponderante na constatação de que os preços no exterior estão mais baixos do que no Brasil é a valorização do real frente ao dólar.
No mínimo, o real está 16% mais forte do que a moeda norte-americana.
Para alguns economistas, esta valorização pode chegar a 40%. É o caso, por exemplo, de quem teve reposição salarial equivalente à inflação do Plano Real (24,11% até janeiro).
"Depois da valorização do real, quem viaja para o exterior acha tudo a preço de bananas"', diz Charles Holland, sócio da empresa de consultoria Ernst & Young, Sotec.
Mas, evidentemente, a conjuntura cambial não é o único fator. Os preços brasileiros são realmente elevados. Levando-se em conta, principalmente, que o salário médio da cidade que mais emprega no país, São Paulo, é de US$ 605,00 mensais —quase cinco vezes menos do que o rendimento médio de um americano.
A economia brasileira tem problemas estruturais com raízes espalhadas em várias áreas.
Os impostos são altos, a ineficiência empresarial é enorme e sistematicamente o Estado atrapalha a economia. Os juros brasileiros estão entre os maiores do mundo e o país tem um salário insuficiente para alargar o mercado de consumo e estimular as empresas a aumentarem a escala de produção.
Outro fator de peso, apontado entre os principais pelos economistas, são as margens de lucro das empresas.
Há anos, os ganhos empresariais dentro de um mercado restrito e até pouco tempo fechado vêm mantendo o Brasil como um dos países mais caros do mundo.
"Os preços no Brasil não se justificam, principalmente nos serviços, que não têm qualidade. O país tem problemas de escala de produção e impostos, mas as margens de lucro é que são muito altas", diz o economista Heron do Carmo, coordenador-adjunto da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), que calcula a inflação em São Paulo.
Segundo ele, merece ressalvas o argumento de que a carga tributária do país é uma das maiores do mundo. "O Brasil tem impostos altos, mas tem também uma das maiores taxas de sonegação e informalidade na economia", diz Carmo.
Pesquisa realizada entre as 500 maiores companhias do país no final do passado pela consultoria Arthur Andersen mostra que, mesmo depois da abertura do mercado e do Plano Real, quase 40% das empresas brasileiras não diminuíram suas margens de lucro.
"Não há dúvida de que as nossas margens são e estão muito elevadas", afirma Antonio Carlos Borges, diretor do departamento de economia da Federação do Comércio do Estado de São Paulo.
"Há também muitos oligopólios (grupos de empresas fortes) que dominam o mercado e os preços. Fabricam o mínimo para atender à procura e lucram muito em cima de quem pode pagar", diz.
O Plano Real também tem sua responsabilidade. "As empresas aumentaram muito os preços na virada do real e decidiram mantê-los altos", diz o economista Gil Pace, especialista em inflação e preços da GPC Consultoria.
Os fortes reajustes na introdução do real explicariam também a manutenção de uma inflação estável no momento. As empresas têm "gorduras" nos preços suficientes para absorver eventuais aumentos de matérias-primas e demandas salariais.
No setor produtivo, a maioria das empresas (80%) acha que o maior problema do país é a carga tributária, de acordo com a Arthur Andersen.
Segundo esta maioria, a redução dos impostos seria a principal medida para estimular as empresas a investir mais e pagar melhor.
Mas a pesquisa mostra também que o empresariado nacional está pouco acostumado à competição e aos preços internacionais. Entre as empresas consultadas, mais da metade não exporta nem 20% do que produz.
(FCz)

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