São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 1995
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Esquizofrenia e privilégio

Reduções de impostos dadas em circunstâncias específicas não podem ser tratadas como um direito adquirido. Em 93, a baixa do IPI dos carros populares serviu para impulsionar o setor em crise e ajudar a tirar a economia da recessão.
Hoje, a preocupação do governo é com a pressão inflacionária do excesso de atividade econômica. E as montadoras estão próximas de seu limite de produção. Nesse cenário, não faz sentido premiar essas indústrias com a redução do IPI dos carros médios de 25% para 15%, como propõem os interessados e, aparentemente, cogita o governo.
As montadoras se beneficiaram da redução do IPI para os carros populares por dois anos e não agiram com energia para eliminar o ágio. O consumidor continua pagando sobrepreços vergonhosos. A indústria não parece em condições de questionar o aumento do IPI dos carros de mil cilindradas, nem de demandar vantagens em troca.
Como, mesmo com a reelevação do imposto, o mercado de automóveis continua aquecido, não é possível atribuir a essa medida uma eventual redução das vendas. Os preços de mercado dos carros populares ainda podem cair muito com a redução do ágio. Ademais, se a redução de impostos pudesse sempre elevar a arrecadação pelo aumento de vendas, não há por que adotá-la só para montadoras.
Vários dos modelos médios, para os quais se estuda reduzir o IPI, já hoje são encontrados com dificuldade. Em vez de beneficiar o consumidor, é possível que a medida resulte novamente na substituição de receita pública por ágio.
Ademais, se a intenção é reduzir o preço de alguns produtos através de renúncia fiscal, automóveis médios só podem estar no final da lista. Alimentos, vestuário, calçados e outros itens da cesta básica têm evidente prioridade. O consumo básico não só é mais importante socialmente, como tem maior relevância no controle da inflação.
Reduzir impostos ao mesmo tempo em que paga juros altíssimos para frear a economia é já uma política esquizofrênica. Aplicá-la ao setor automobilístico torna-a ainda mais inconveniente. Seria priorizar o consumo de alta renda.

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