São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 1995 |
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O falso bicho-papão
CLÓVIS ROSSI SÃO PAULO — Da Constituição de 1988, já se disse de tudo. Inviabilizaria os investimentos, principalmente estrangeiros. Inibiria o crescimento econômico. Ou, para resumir, tornaria o país "ingovernável".A maioria dos brasileiros comprou essa lenga-lenga toda, até porque brasileiro adora comprar bobagens. Não que a Constituição seja um primor. Está longe disso. Mas o problema é que ninguém parece disposto a parar para pensar e verificar se ocorreram ou não todos os horrores que se atribuiram à Carta. O país ficou ingovernável? Do ponto de vista político-institucional, a Constituição foi testemunha muda das duas eleições presidenciais mais democráticas da história republicana. E foi também testemunha de uma ação profilática pioneira no planeta: o afastamento, igualmente democrático, de um presidente que faltou ao decoro. Do ponto de vista econômico, a Constituição de 88 não impede que o Brasil tenha hoje a mais baixa taxa de inflação em muitos e muitos anos. Ou que a produção industrial de 94 tenha crescido imponentes 7,6%, depois de ter crescido 7,5% no ano anterior —cifras que raros países do mundo podem exibir. Investimentos? Só as quatro montadoras de automóveis anunciaram, num único dia, US$ 5,3 bilhões. O Banco de Boston, no mesmo dia, prometeu duplicar (de US$ 3,5 bilhões para US$ 7 bilhões) os seus investimentos no Brasil. No total geral, o Brasil é hoje exatamente 7,32% mais rico do que era ao terminar 1988, o ano em que a nova Constituição ficou pronta. Onde a Constituição falhou foi exatamente no que se disse que ela tinha de exagerado: a proteção social. O Brasil de 94 é tão miserável quanto o Brasil de 1988, 87, 86 e qualquer outro ano que o leitor queira colocar. Falhou porque tinha que falhar. Problemas sociais não se resolvem por decreto ou pela Constituição. Nada contra reformá-la. Mas que não se tente usar a Carta como bicho-papão. Afinal, como alguém já disse, gente grande não deve ter medo de bicho-papão, ainda mais quando ele é falso. Texto Anterior: A crise continua Próximo Texto: Cura e vício Índice |
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