São Paulo, sábado, 25 de fevereiro de 1995
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Concessões suspeitas

O episódio do festival de concessões patrocinado pelo governo Itamar Franco nos seus estertores vem ganhando novas dimensões, tornando ainda mais indispensável uma severa investigação. Como se sabe, nos cinco dias finais da gestão passada, o então ministro das Comunicações, Djalma de Morais, outorgou 349 concessões para serviços de telecomunicações.
Um exemplo sugestivo do caráter dessas concessões veio a público com a revelação de que uma empresa recebeu 41 concessões, apesar de não dispor de capital remotamente próximo do necessário para dar início aos serviços. Com a demanda por apurações, o beneficiário pediu o cancelamento das concessões —atitude que obviamente não elimina as suspeitas nem quanto ao seu caso, nem quanto a outros envolvidos.
Mas o mais surpreendente nos desdobramentos do "affaire" é que o próprio ex-ministro confessou que o sistema de concessões que ele adotava abria margem para "picaretagens". É uma aberração.
Como se não fosse sua responsabilidade encontrar um meio de fechar essa brecha, teve ainda o desplante de cobrar da imprensa que fiscalizasse os "maus elementos" que havia beneficiado. Não bastasse, admitiu a total falta de critério —se é que era só isso— que pautava as concessões. "Todo mundo que pediu ganhou", afirmou.
É notório que no passado essas permissões foram reduzidas a moedas de troca política. Mas que tais práticas de tempos negros da moralidade administrativa do país tenham sido repetidas na gestão Itamar, ainda que noutras dimensões, é algo que causa consternação.
Repita-se que não há como isentar Morais de responsabilidade, independentemente de ter havido ou não dolo. Como gestor público, era seu dever cuidar da lisura no trato de patrimônio todos nós.
Não se trata decerto de comparar o padrão de imoralidade do governo Collor, por exemplo, com o de Itamar. Isso não significa porém que suspeitas levantadas quanto à última gestão não devam ser apuradas até o fim. Pelo contrário. E o próprio ex-presidente deve estar tão interessado nessa investigação quanto qualquer pessoa minimamente preocupada com o bem-estar da coisa pública no país.

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