São Paulo, domingo, 26 de fevereiro de 1995
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Usuários protestam contra fim de oficinas

GEORGE ALONSO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Que Estado mínimo é esse, em que a gente só paga impostos, a gente só paga e não recebe nada?" A pergunta foi repetida várias vezes por usuários da Oficina Cultural de Itaquera, que fechou na zona leste de São Paulo, um bairro sem cinema e teatro.
A casa, que oferecia cursos gratuitos de artes (dança, música, pintura, teatro) para 1.077 moradores da região, é uma das 15 oficinas culturais do Estado que estão com suas atividades paradas.
Desde a quinta-feira passada, quando venceu o aviso prévio de seus 17 funcionários, a casa é frequentada apenas por quatro funcionários de segurança e limpeza.
No último dia 15, cerca de 40 usuários —a maioria jovens sem opção de lazer e cultura na região— mostravam, durante reunião pela manutenção da oficina, sua irritação e desapontamento com o governo Covas.
Eles preparavam uma última feira de arte feita na rua em frente à oficina. A feira levava o nome sugestivo de "Canjica de Marte", como a anunciar que ali, naquela terra, não haveria mais espaço para a "canjica de artistas".
"Sem a oficina vou ter que pagar para fazer um curso de teatro. E como vou pagar?", perguntava indignada Edilene Sena, 19, que também é professora de uma escolinha infantil. Pelo trabalho, ganha por mês a "gigantesca" quantia de R$ 180.
Situação semelhante é a de Carlos Sidney de Assis Marques, 18, auxiliar de escritório, cuja renda mensal de sua família (tem mais três irmãos) é de apenas R$ 800. Ele fazia curso de artes plásticas até o final do ano passado. "Agora não tenho opção", dizia.
Sem a oficina, os usuários se sentem órfãos. Na zona leste, onde vivem cerca de 3,5 milhões de pessoas, há outras duas oficinas culturais: uma no Tatuapé e outra em São Miguel Paulista. Mas ambas também estão paralisadas e até agora sem garantias ou prazo para voltar a funcionar.
"Aqui é um lugar acessível, onde a gente encontra gente que tem desejos parecidos, aprende coisas diferentes, recebe cursos de artistas famosos", reclamava a estudante Regilucy Bruda, 21, que fez cursos de pintura a óleo, teatro e expressão corporal na oficina de Itaquera.
O secretário da Cultura, Marcos Mendonça, disse à Folha que obteve autorização de efetuar contratações de emergência para repor cerca de 50% dos 1.500 funcionários demitidos de sua pasta, por serem do Baneser.
O prazo da retomada das atividades, porém, ainda é incerto —já que o governo ainda não apresentou alternativas reais para o funcionamento dos equipamentos culturais do Estado.
O fato é que, além das oficinas culturais (nove na capital e seis no interior), vários setores da Secretaria da Cultura estão comprometidos —como os museus (o MIS já está parado). Para os usuários, houve precipitação do governo.
"A medida do governo foi radical, de fechar tudo, como se nada feito antes prestasse. Vamos moralizar, mas parece que o Covas fez as coisas com afobação", afirmou Yolanda Gentileza, 54, que fazia curso de teatro na oficina Oswald Andrade, na região central.
"Votei no Covas e fiquei decepcionada. Fiquei passada. Sou a favor do enxugamento do Estado, mas achei insano fechar as oficinas", ironizou Cristina Sano, 30, que fez curso de dramaturgia.
"Isso o que Covas fez é radical e está fora do que ele prometeu na campanha", completou ela.
(GA)

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