São Paulo, domingo, 26 de fevereiro de 1995
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Escritor defende o prazer do futebol

ROBERTO MACHADO
DA SUCURSAL DO RIO

Apaixonado por futebol, o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano diz que no esporte a América Latina superou a dominação européia. "Aqui se joga o melhor futebol do mundo, com graça, dança e música", afirmou.
Galeano esteve no Rio, semana passada, para finalizar o trabalho de pesquisa do seu próximo livro, que terá o futebol como tema.
"Futebol a sol e sombra" deve ser concluído nos próximos dias. Segundo o autor, o livro será lançado no Brasil provavelmente no início do próximo semestre.
A Folha publica, com exclusividade, trechos de três capítulos: "O torcedor", "O fanático" e "O juiz".
Uma das principais preocupações de Galeano nesta obra é mostrar o outro lado do futebol. "Falarei sobre as estruturas comerciais que têm sequestrado o futebol, e que são responsáveis pela transformação do prazer em dever", disse.
"O livro também é uma homenagem. O futebol é uma festa dos olhos que o olham e uma alegria para o corpo que joga. Mas não tenho a pretensão de revelar toda a sua beleza", afirmou o autor.
Galeano se define como um defensor intransigente das utopias e lamenta que os países da América Latina tenham "abandonado o sonho de conquistar a justiça social" para adotar o receituário "de um liberalismo ultrapassado".
Ele se conforta com a idéia de que, no futebol, a América Latina desempenha um papel inverso ao que tem na política ou na economia. "Nós subvertemos e superamos o futebol original, que veio dos ingleses", disse.
No novo livro, ele reserva elogios principalmente ao Brasil. "Em matéria de música e de futebol, sou um traidor da pátria: prefiro o Brasil a qualquer outro país do mundo", disse.
Galeano considera o futebol que se joga na Europa uma espécie de "atletismo". "A força e a velocidade são mais importantes que o talento e a espontaneidade. O resultado é um estilo feio, de passes longos pelo alto. Tem vigor, falta vida", afirmou.
O maior perigo que os latino-americanos correm, segundo o escritor, é o de querer imitar o estilo europeu. "Não faz nenhum sentido. A idéia central é: a beleza pode ser eficaz", defende.
A prova da eficácia seria a superioridade dos países da América do Sul em relação aos países da Europa na história das Copas do Mundo. "E olha que eles sempre concorrem com pelo menos o dobro de países", afirmou.
Se Brasil, Argentina e Uruguai ainda são os principais representantes dos "países oprimidos", Galeano também reserva muitos elogios ao futebol colombiano.
"O que aconteceu na Copa com a Colômbia foi um acidente. Conheço a técnica e a habilidade de seus jogadores", afirmou.
Os países africanos também foram lembrados pelo escritor.
"Os jogadores de lá têm força física e estão se tornando muito habilidosos", afirmou Galeano, que espera pelo fim da reserva de mercado para os países europeus, que detêm o maior número de vagas para as Copas do Mundo.
O autor culpa a Fifa por esse protecionismo: "A estrutura da Fifa é monárquica. Ela tem um rei, o João Havelange (presidente da entidade) e funciona como uma grande corporação multinacional, que visa só um objetivo: o lucro."

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