São Paulo, domingo, 26 de fevereiro de 1995
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FABIO, O TODO BOM

HELOISA HELVECIA

"O fotógrafo nem precisa falar nada: eu me solto e, colocando a roupa, sinto tudo o que ele quer", divulga. Posou para Peter Lindenbergh, Thierry Mugler (o estilista fotografa suas coleções), Pamela Hantson, Jean Baptiste Mondino...
O sucesso dobrou até o pai, que hoje coleciona fotos do filho e mostra às visitas. "Chega a dar vergonha." A mãe diz que já se acostumou "a esse trabalho do Júnior" e atesta: é ótimo filho. "Ele não é mesmo lindo?", pergunta.
A culpa, de certa forma, é dela. "Minha mãe conta uma história engraçada. Antes de eu nascer, ela rezava para ter um filho de olhos claros, porque meus irmãos são morenos de olhos escuros. Rezava, rezava e dizia —quero ver se Deus existe mesmo." Quando Fábio nasceu, 4,5 quilos, branco, olhos claros, o médico do hospital de Fernandópolis chegou com o bebê no quarto e só convenceu a mãe de que não era engano quando provou ser ele o único menino nascido naquele 10 de junho. "Aí ela acreditou que Deus existe."
Fabio acha que homem "não precisa" ser bonito. "Os fotógrafos querem alguém que passe algo para a câmera. Precisa passar aquela coisa viril, de homem, a personalidade. Mulher não, é só ter uma pele bonita, colocar a maquiagem, a luz excelente e fica maravilhosa. Não precisa ser tão inteligente nem mostrar tanta personalidade quanto o homem", acredita.
Mas diz preferir as inteligentes e "comunicativas". No item companhia, ele opta por falar em tese, faz mistério. Já namorou modelos, claro, e morou um tempo com uma em Paris. Justifica o silêncio com um "estou de rolo". Nunca amou, avisa, mas teve paixões e fez estragos em mulheres de diferentes faixas de idade e estados civis. Diz que é mais apaixonado por sua independência. "Não sei terminar minhas relações. Quando acaba, saio fora, não consigo dizer tchau", fala o fofo.
A tietagem mais ingênua até acha "legal". Dois anos atrás, saiu de Paris para visitar os pais e acabou dançando valsa de debutante com uma fãzinha local. Já cantada explícita o ofende. A mais recente, e "pior", recebeu de uma apresentadora de TV, que o localizou no hotel e ligou, dizendo que queria raptá-lo para jantar. "Nunca falei com ela", estranha.
Anda fugindo dessa história de símbolo sexual, que é "muito vulgar". Já recusou vestir uma sunga forrada de palha, criação de um estilista português, num desfile em Barcelona. Não fotografa de underwear ("vendo a roupa que visto, não a mim mesmo"), cultiva amigos fora do métier, não faz o circuito de vida noturna. "Não me atrai. Isso de sair à noite para ser visto já vira prostituição". Seus amigos são bookers da agência e a turma de infância de Ribeirão.
Modelo místico, acha que sua trajetória no mundo da moda é ponte para crescimento espiritual. "É tudo muito fácil, você pode tudo, então precisa tomar cuidado. Eu me policio, tenho consciência, drogas, bebidas, morar sozinho, é tudo um desafio para mim. Sem cabeça boa você entra em todas".
O ajuizado Fabio também não gosta de cantada de homem. "No Brasil, é uma pentelhação. Lá fora não, respeitam. Aqui acham que você também é bicha. Outro dia, quase bati no cara. Às vezes brigo. Escuto, escuto até que explodo à toa".
Explodiu na primeira vez que foi ao Japão. Modelos ocidentais concentrados num só prédio, vivendo em gueto, trabalhando sem trégua. "Era muita concorrência, muito estresse, muita fofoca, muita putaria", define. Uma vez, num McDonald's, deu uns bofetes em duas modelos. "Estavam bêbadas, jogaram bandeja em cima de mim, rolou cadeira, um horror". Também brigou com a dona da agência, uma japonesa que, no início, tentou "ter um lance" com ele e, no fim, enrolou o pagamento de uns cachês e deixou o pobrezinho vivendo sem TV, vídeo nem talheres. "Quando chegou o que faltava para equipar o apartamento, era véspera de eu ir embora. Joguei a TV da janela do 7º andar, dei vídeo e talheres para amigos."
Outro momento trágico da supercarreira foi em 90, na Itália. Depois de uma semana lá, foi contratado para fazer 30 páginas de "Vogue Uomo", trabalho de 15 dias com o fotógrafo Fabrizio Ferri, na Sicília. "Fiquei feliz, sabia que a revista ia chamar mais trabalho." Um pouco antes de a reportagem sair, o moleque sentou num corrimão da escada de uma estação de metrô, escorregou, caiu num ferro e cortou a coxa direita. Trinta pontos, que infeccionaram e o deixaram um mês na cama, sem poder fazer uma campanha para Armani. O acidente, diz, fôra previsto por uma vidente e descrito em carta de uma amiga.
Acredita nisso e também naquilo de querer é poder. "Basta ter paciência. Mas não pode ficar bitolado, se não vira carma, como dizia minha avó. Levo na ligeira, se acontecer, ótimo".
Para ajudar, Fabio entrou na moda dos anjos. "É fabuloso, a vida fica mais leve." Pela tabela angélica, sua data de nascimento corresponde ao tipo roliço, brincalhão, eterno bebê. "Sou um querubim", afirma. Incontestável.

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