São Paulo, sexta-feira, 10 de março de 1995
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Redford critica submissão da mídia ao entretenimento

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

"Quiz Show", o novo filme dirigido por Robert Redford, aborda, retoma e aprofunda alguns temas caros ao ator e cineasta: a responsabilidade da mídia e da indústria do entretenimento; o drama da escolha moral; e aquilo que Redford chama de "o lado sombrio das elites, a danação dos nascidos em berço de ouro".
Seu foco é o escândalo que, no final dos anos 50, envolveu o popularíssimo programa de perguntas e respostas "Twenty One", líder da audiência da rede NBC.
O filme de Redford —e o brilhante roteiro de Paul Attanasio— mostra o princípio o duelo entre Herbert Stempel (John Turturro) um judeu pobre e feio e Charles Van Doren (Ralph Fiennes), um Wasp sangue azul, bonitão e professor universitário. Por trás da luta de ambos ocultam-se temas poderosos: classe, etnia, moral, poder e mídia numa América que, irônica e assustadoramente, se parece muito com a de hoje.
Robert Redford falou à Folha, em Los Angeles.

Folha - Por que você escolheu este projeto para dirigir?
Robert Redford - Eu tinha pensado em tirar umas férias do meu trabalho como diretor depois de "Nada É Para Sempre". Queria passar um ano trabalhando apenas como ator, mas quando recebi o roteiro eu não consegui resistir.
Ele me provocou sentimentos muito especiais, porque aborda temas que são muito caros para mim. Então decidi embarcar no projeto como produtor e diretor.
Folha - Que "temas caros" são esses?
Redford - A mídia, a responsabilidade da mídia, a capacidade da mídia em engendrar verdades e mentiras. Como ator, já havia me aproximado desse assunto em "Todos os Homens do Presidente", mas sempre achei que havia muito campo para reflexões mais profundas. E à medida em que os anos se passavam, mais estas questões se tornavam urgentes.
Folha - Como você vê a possibilidade de um paralelo entre as questões dos anos 50 e o que está acontecendo hoje nos EUA?
Redford - Nos anos 50, quando "Quiz Show" se passa, tivemos o macartismo. Quase perdemos todas as nossas liberdades constitucionais, uma a uma: liberdade de expressão, de religião, de associação, de pensamento, de imprensa. Estivemos muito próximos de perder tudo isso. Estivemos muito próximos do fascismo. E nos salvamos na última hora.
Depois, com Wagertate, estivemos perto do mesmo perigo. Estamos de novo correndo o risco de perder nossas liberdades e direitos civis e, mais uma vez, a mídia vai ter papel vital nessa luta.
Folha - Você não parece ter a mídia atual, principalmente a eletrônica, em alta consideração.
Redford - Creio que a mídia em geral, e a TV em particular, nos EUA pelo menos, perdeu em credibilidade. Tudo, hoje, é entretenimento. A preocupação com a verdade desapareceu, diluída no conceito de "entretenimento".
E a raiz deste processo está no escândalo dos programas do tipo "Quiz Show", quando, em nome da audiência, a verdade e a honestidade foram sacrificadas. É o início de uma sedução, quando grandes quantidades de dinheiro e poder são colocadas à disposição de pessoas dispostas a trocar seus princípios por isso.

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