São Paulo, terça-feira, 14 de março de 1995
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Novas perspectivas para a citricultura

ADEMERVAL GARCIA

Há momentos em que a junção de circunstâncias diversas —melhor diria, adversas— muda o rumo da atividade econômica. Isto está acontecendo com a citricultura neste momento.
A seca que atingiu os pomares ano passado —a maior desde 1963— produziu reflexos que se estendem pela nova safra, entre os quais um atraso de dois meses no início da colheita, além de erradicação acelerada de pomares mais velhos, com possível influência no total a ser colhido na safra 95-96.
Estes dados serão conhecidos no próximo dia 21, quando estará concluída e divulgada pela Abecitrus a previsão para a nova safra.
O segundo evento foi o Plano Real. Em 1º de julho, data de sua implantação, uma URV valia um real, que valia um dólar. A URV desapareceu, o real continua firme, felizmente, mas o dólar desabou para R$ 0,83, reduzindo a a receita da indústria em pelo menos 17% que, projetado para o ano safra (julho-junho), custou US$ 204 milhões (exportações de US$ 1,2 bilhão) para a indústria, e o equivalente a 17% para o produtor.
Mas o real também sofre a erosão inflacionária reconhecida de 23% nos seus oito meses de vida, não incorporados ao câmbio.
Isto significa que entre aumento de custo e redução de receita o setor tem no caixa 40% menos do que tinha em 1º de julho passado.
A terceira circunstância é o crescimento do mercado interno de fruta fresca, com a elevação do poder aquisitivo da população. Este mercado, até certo ponto negligenciado pela maior atração do uso industrial da fruta, consumiu cerca de 60 milhões de caixas na safra que termina, pode chegar a 80 ou 100 milhões de caixas na safra 95/96 e crescer ainda mais nos próximos anos. Mesmo porque é grande o interesse do suco pronto para consumo. De novembro de 94 a fevereiro último, este mercado cresceu 72%.
Ao mesmo tempo, a Flórida produz a segunda maior safra de sua história (203 milhões de caixas) e tudo leva a crer que continuará se expandindo, apesar de o mercado americano estar a ponto de saturação, mas protegido por tarifa de US$ 492/t sobre à importação do suco brasileiro.
No vácuo dessa expansão e do Nafta, os EUA já nos inviabilizaram no mercado do Canadá, que importava em média 20 mil t do Brasil e em 94 importou apenas 1.000 t. Os EUA recuaram de 35,1% das nossas exportações na safra 93/94 para 26% nesta safra.
Finalmente, a debacle econômica do México e as vantagens tarifárias que o acordo Nafta lhe oferecerem prenunciam que aquele país terá menos consumo interno de fruta fresca e maior interesse na exportação de suco para os EUA.
A coincidência dessas circunstâncias redirecionam o uso de laranja na próxima safra. Para atender a um mercado interno de 80 a 100 milhões de caixas e ainda assim manter exportação de ordem de 900 mil a 1 milhão de t, a próxima safra terá que ser da ordem de 300 a 320 milhões de caixas, a maior de nossa história. Safra menor ou maior demanda no mercado interno serão traduzidos em redução na produção do suco e nas exportações de concentrado.
Na verdade, o que muda essencialmente é a relação com os produtores, na medida em que a indústria deixa de ser o principal destino da produção para transformar-se em caudatária do mercado interno. O produtor precisa estar atento a esta mudança, que é profunda, e se preparar para produzir fruta de melhor qualidade para o mercado interno mais remunerador, mas mais exigente também.

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