São Paulo, terça-feira, 14 de março de 1995
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O pêndulo em ação

JANIO DE FREITAS
O PÊNDULO EM AÇÃO

O recuo imediato do presidente em relação à medida provisória 935, ante a ameaça de demissão do ministro Adib Jatene por não admitir a MP, salvou Fernando Henrique Cardoso e o governo de uma queda fatal no abismo do descrédito. A saída de alguém com a estatura de Jatene, aos dois meses e meio de governo, não equivaleria a menos do que isso. Mas o recuo deixou às claras o processo de decisão presidencial: quem pressionar, ou criar uma situação interpretável como pressionante (este foi o caso de Jatene), recebe a decisão favorável.
Mandada ao Congresso, onde suscitou forte reação, a MP 935 sangraria a Presidência e a Saúde em estimados US$ 5 bilhões. Como solução idealizada pelo ministro José Serra para cobrir rombos do Tesouro que ele e a equipe econômica, em geral, não estão conseguindo evitar.
Informado da intenção do Planejamento, o ministro Jatene opôs-se à MP e por isso foi convocado por Fernando Henrique a confrontar seus argumentos com os de Serra, em reunião no Planalto. Entre a serenidade de Jatene e a impetuosidade de Serra, não é preciso dizer por quem Fernando Henrique optou.
O capítulo seguinte foi o de sexta-feira. A meio da nova conversa com Jatene, Fernando Henrique já decidira recuar no assalto da MP à Previdência e à Saúde, como logo depois seria comunicado. Se a MP não era a solução indicada, como e por que foi emitida pelo presidente? Se era, como e por que decidiu reconsiderá-la? Não eram R$ 5 que estavam em jogo, eram R$ 5 bilhões —o montante que a Previdência agora podia perder em socorro ao Tesouro, mas não tinha há poucas semanas para permitir o reajuste do salário mínimo. É tristemente óbvio que nem mesmo uma decisão de tal magnitude se fundamente em critérios rigorosos e bem avaliados.
Em outro plano, mas simultâneo ao recuo na MP, a demissão de Pimenta da Veiga da presidência do PSDB expunha também o pêndulo presidencial. Embora advertido por Pimenta do problema criado por Sérgio Motta, que se recusa à regra de deixar a secretaria do partido desde que ministro, Fernando Henrique deu amparo ao amigo para ostentar a recusa, desmoralizando Pimenta, na reunião dos dirigentes partidários.
Surpreendido pela correta demissão de Pimenta, com o consequente agravamento da indisposição dos políticos ante o núcleo dominante do governo, o presidente acionou apelos ao demissionário para reconsiderar o gesto. Pôs-se, pessoalmente, à cata dele por telefone e mandou-lhe um convite (não respondido) para uma visita ao Alvorada no domingo: "Estou à espera dele de portas abertas e de coração também".
Os recuos na anunciada cronologia de ações do governo, na programação quantitativa das alterações constitucionais, no teor das alterações já propostas, assim como o frequente diz e desdiz nas privatizações e em tanto mais, refletem as oscilações pendulares decorrentes de pressão direta ou do interpretado como pressionante. No que os meios de comunicação deram como governo de intelectual, toda decisão é só emocional.

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