São Paulo, terça-feira, 14 de março de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Natureza vinga-se do homem

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

"Cinema é cachoeira", dizia Humberto Mauro. "Cinema é corredeira", poderia rebater o John Boorman de "Amargo Pesadelo" (Globo, 0h55).
Mauro, enorme cineasta, tinha uma sensibilidade idem para tudo que implica uma cachoeira: a natureza, o movimento, a força, os contrastes, a sensualidade.
É uma metáfora perfeita do cinema. Aliás, o filme roda dentro da câmera como uma cachoeira, de maneira regular e descontínua; a diferença é que o filme é puxado pela grifa e a cachoeira pela força da gravidade.
O que aproxima Boorman e Mauro é a capacidade de ora aproximar e ora opor a natureza e o homem (a cultura). Em "Amargo Pesadelo", quatro sujeitos dispõem-se a descer um rio e suas corredeiras em canoas.
O choque se dará no momento em que o grupo se verá às voltas com uns tantos criminosos dispostos a arrancarem suas peles, literalmente, e terão de buscar no fundo de si mesmos a reserva que lhes permitirá sobreviver.
Desde o início, desde o notável duelo de banjos que precede a aventura, Boorman deixa clara sua posição sobre o assunto: o homem que invade a natureza de certo modo aventura-se no território do divino e torna-se sujeito às penas correspondentes.
No caso dos quatro rapazes, um acontecimento singular. A reflexão, ao contrário, é bem mais abrangente: fala de um homem cujas relações com a natureza permanecem irresolvidas. E que ao não violarem os direitos da natureza passam a tê-la contra si. Pode-se ver "Amargo Pesadelo" ou dar uma olhada ao redor, dá no mesmo. Mas quem der uma olhada ao redor depois de ver o filme verá um mundo um tanto diferente.
(IA)

Texto Anterior: Pérsio Arida em 'PhDeu tudo errado'!
Próximo Texto: Iran do Espírito Santo joga com tramas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.