São Paulo, terça-feira, 14 de março de 1995
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Iran do Espírito Santo joga com tramas

CARLOS E. UCHÔA FAGUNDES JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

Iran do Espírito Santo em sua segunda individual em São Paulo, traz mais uma vez a estranheza do olhar analítico sobre padrões visuais que impregnam o cotidiano.
Iran tem apresentado seu trabalho em importantes mostras no Brasil, como a 19ª Bienal de São Paulo ou a recente "Espelhos e Sombras" no MAM. Inquieto em sua pesquisa, participou também da exposição "Lingua Latina Est Regina" na Stux Gallery de Nova York e foi artista residente do espaço experimental Plug In Inc. Gallery em Winnipeg (Canadá), e no reputadíssimo Tamarind Institute, em Albuquerque (EUA).
Sua obra faz jogos com a memória, mas não num sentido narrativo ou verbal, confortador, como na grande fatia da arte de última geração, infantil e cretinizada, que lida com contos de fada, insignificâncias autobiográficas e coisas do gênero. Iran corta esses elos e usa uma possibilidade de conhecimento visual, alternativa a uma razão ligada à palavra, analisando a memória de estruturas visuais que se repetem e são disseminadas, não se ligando a nenhuma situação ou objeto particular.
Seu processo de trabalho está impregnado de algumas invariantes plásticas básicas, como as grades de verticais e horizontais, que, encontradas no cotidiano, vão se abstraindo em direção à perda do significado e se convertem em objetos de arte.
É assim que funciona "No Xadrez", o trabalho chave da exposição. As paredes pintadas com um padrão xadrez aumentado cria uma vivência específica para o observador (entre o abrigo e a prisão), desvendando algo que estava contido no próprio convivío cotidiano com padrões visuais similares reproduzidos em lãs, capas de cadernos, pastas, colchas e uma infinidade de outras coisas.
Outra obra, "Tomograma", traz os buracos circulares que remetem a uma grande série de trabalhos e instalações anteriores do artista. "Tomograma" repete a experiência paradoxal de um significante cujo significado foi esmaecido, disseminado, multiplicado.
É uma espécie de divisória de vidro e vazada pelos furos, que nada esconde e ao mesmo tempo estabelece uma distância impossível entre si mesma e seu significado para o espectador, como o vidro de muitos guichês públicos, com sua abertura circular, marcando simultaneamente uma proximidade e uma distância intransponível entre o cliente e o funcionário.
Esta estrutura visual de queijo suíço marca a noção de passagem contínua de uns a outros sentidos possíveis.
Isto se entende, por exemplo, numa instalação que Iran fez no Canadá, onde a entrada majestosa de um antigo banco foi transformada num pequeno aposento de madeira vazado por inúmeras aberturas circulares que permitiam visões parciais e renovadas sobre o velho saguão.
Por esse caminho, a obra de Iran é pessoal e relevante em suas operações, mas na atual exposição, para o espectador desavisado, fica devendo um pouco de impacto visual, embora se saiba que a assepsia com que foi montada faz parte do jogo.
Exposição: Iran do Espírito Santo
Onde: Galeria Luisa Strina (r. Padre João Manoel, 974A, Jardins)
Quando: abertura hoje, 19h, até 5 de abril, de segunda a sexta, das 10h às 20h, sábados, das 10h às 14h

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