São Paulo, segunda-feira, 20 de março de 1995
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A guerra dos amigos do peito

HELCIO EMERICH

A briga começou na Inglaterra. Desde 1990 o grupo Gossard tinha licença da firma canadense Canadelle (ligada à americana Sara Lee) para vender os sutiãs Wonderbra na Europa. Em 1993 a licença expirou e, por razões comerciais, a Canadelle resolveu nomear um outro fabricante, a Playtex. O troco da Gossard foi criar uma marca própria, a Super-Uplift, cujo lançamento foi o estopim de acirrada batalha publicitária no mercado britânico. Na campanha pela TV, um comercial da Gossard mostrava uma festa durante a qual duas mulheres disputavam a atenção de um jovem, até que uma delas arranca a blusa da outra para mostrar ao rapaz que sua rival vestia um "sutiã desses comuns". A Playtex respondeu com um anúncio estrelado pela estonteante modelo tcheca Eva Herizgova (exibindo sua opulenta "equipage" embalada por um Wonderbra) cujo título dizia "Olhe-me nos olhos e diga se você me ama".
As duas marcas extrapolaram os limites do politicamente correto na propaganda mas as campanhas empurraram as vendas para cima: a Playtex saltou de 250 mil unidades por ano em 93 para 640 mil em 94. A Gossard não revelou números, mas admitiu que o Super-Uplift quebrou no ano passado todos os recordes anteriores de vendas da companhia.
Antes disso, na primavera de 93, as duas inimigas já haviam transplantado suas escaramuças para o mercado dos EUA. A Playtex começou por Nova York para, aos poucos, estender o lançamento do Wonderbra aos demais Estados americanos. Numa campanha milionária, que incluía várias ações de relações públicas e promoção (as verbas foram bancadas pela Sara Lee), a empresa continuou explorando a exuberância da modelo tcheca, que perguntava nos anúncios: "Que importa se o dia não vai ser bom?" A Gossard evitou o confronto direto, preferindo o caminho "hard sell": um dos seus anúncios, intitulado "The Miracle System", descrevia o sutiã Super-Uplift como uma verdadeira obra de engenharia, mostrando que ele é montado em 46 partes, que exigem 26 estágios de costura, "acrescentando curvas até aos bustos menos dotados".
Pegando as sobras da refrega, outros fabricantes como a Victoria Secret e a Really Works também resolveram promover ou relançar seus produtos, mas a polêmica entre os marqueteiros e publicitários quanto à eficiência das campanhas desta ou daquela marca acabou descambando para temas mais subjetivos. Há quem ache que ao comprar um sutiã a mulher deseja realmente parecer mais jovem e sexy, mas que também uma peça do vestuário que ela possa usar durante várias horas com o máximo de conforto (conceito de "mulher executiva" ou "mulher ao volante"). Há os que acham que os fabricantes estão desenhando sutiãs para agradar ao sexo masculino, na certeza de que os homens influenciam o tipo de roupa íntima que as mulheres usam. Uma terceira corrente acredita que a mulher só se define por uma marca quando entra na cabine da loja e experimenta três ou quatro modelos diferentes, sem dar muita bola para a marca ou a imagem dos fabricantes. Se as campanhas tivessem terminado em fracasso, não haveria polêmica. Mas a ofensiva da Playtex, Gossard e dos seus coadjuvantes resultaram em volumes históricos de vendas no mercado americano. Até marcas que se mantiveram à margem da guerra do "bra" tiraram sua lasquinha, como aconteceu com a conservadora Maidenform, que aumentou suas vendas em 20%.

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