São Paulo, sexta-feira, 24 de março de 1995
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Jessica Lange encobre falhas de "Céu Azul"

INÁCIO ARAÚJO
DA REDAÇÃO

Filme: Céu Azul (Blue Sky)
Produção: EUA, 1994
Direção: Tony Richardson
Elenco: Jessica Lange, Tommy Lee Jones, Powers Boothe
Onde: a partir de hoje nos cines Vitrine e Calcenter 2

Se a história do engenheiro militar Hank Marshall (Tommy Lee Jones) se passasse na velha URSS, "Céu Azul" seria um filme sobre a utilização política da psiquiatria.
Como acontece nos EUA, o fato de Marshall acabar internado a horas tantas da intriga é subproduto de um triângulo amoroso em que Carly (Jessica Lange) é o pivô. Para que o aspecto mais grave suscitado pela trama seja devidamente abafado, providencia-se um vilão, na pessoa do comandante da base, Vince Johnson (Powers Boothe).
Johnson é que trata de internar Marshall, para melhor transar com Carly. Como a história se passa em 1962 e envolve a realização ou não de testes nucleares à luz do dia, temos um exemplo de deslocamento do eixo de uma história, em prejuízo de seu aspecto histórico: militarismo, Guerra Fria, uso da psiquiatria formam um conjunto significativo do que foram as relações internacionais no século.
Eles são colocados na surdina em "Céu Azul". Dão lugar à personalidade fascinante de Carly, única personagem do filme realmente complexa. Ela é fútil, irresponsável, infantil, sensual, lutadora, fiel, infiel.
Seria exagero dizer que Jessica leva o filme nas costas. Mas é quase isso. Além de uma direção de arte que faz uma reconstituição de época sensível e de Tommy Lee Jones, notável, não sobra tanta coisa assim.
É uma pena que o filme não tenha retido os vários elementos que o argumento de Rama Laurie Stagner sugere (tanto mais porque o material de base é biográfico, diz respeito a seus pais). Seu desaguadouro natural seria a questão da psiquiatria —tão mais viva porque, mesmo após a Guerra Fria, a hipótese de exclusão das pessoas da vida social com apoio científico continua problemática.
É verdade que no passado Hollywood usou esse procedimento com frequência. Mas os filmes ofereciam prazeres relevantes como compensação. Além do mais, hoje os EUA estão em condições de mostrar com sinceridade esse período obscuro de sua história.
Como se refugia no drama passional, o que resta de concreto em "Céu Azul" é um filme meio antiquado em que Jessica Lange brilha. Ela não só brilha, como de costume, mas também grita e tem ataques histéricos. É bem possível, portanto, que acabe levando o Oscar. Por alguma razão misteriosa, de tempos em tempos o Oscar se torna muito sensível a atrizes que gritam. Carly é uma versão "light" da Liz Taylor de "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" (1966). E já está mais do que na hora de Jessica ganhar o prêmio de melhor atriz. (IA)

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