São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
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NA PONTA DA LÍNGUA

MARCELO LEITE

A Folha anda se excedendo com o xis, essa letra exótica, digna de ser extinta. No domingo em que o caderno Tempo Real já deixava de ser caderno (19 de março), o excelente texto "Catastrofistas vêem riscos de um novo 29" saiu com a seguinte excrescência: "jogar suas fixas na aposta...". Mais adiante, outro tropeço na letra-encruzilhada: "taxados ora de nacionalistas, ora...".
Na crítica interna da edição, esperneei. O Erramos saiu, dias depois, mas só corrigiu o primeiro escorregão. Chiei de novo e recebi da Secretaria de Redação uma resposta lacônica: "Taxar/tachar pode ser das duas formas".
Até aí morreu Neves, pensei comigo. "Taxar" é pôr preço ou cobrar imposto; "tachar" significa apontar tacha (mancha) ou, em sentido figurado, qualidade ou aspecto negativo.
Por via das dúvidas, fui checar nos dicionários. A única justificativa que encontrei -e que provavelmente serviu de apoio para a Redação recusar-se a retificar o erro evidente- foi um estranho comentário de Leite de Vasconcelos citando Aires da Mata Machado Filho, abrigado no "Novo Dicionário Aurélio" (verbete "tachar").
Por economia de espaço, deixo de reproduzi-lo aqui. O argumento central é que "tachar" pode ser usado só para atribuir qualidades negativas a alguém ou alguma coisa, mas "taxar" (no sentido de atribuir valor) serve tanto para as negativas quanto as positivas. "Ambos os verbos significam, ao cabo de contas, o resultado de um julgamento."
Ora veja. Não só descobri que o que aprendera anteriormente estava errado, como reinstaurou-se a confusão. Vale quase tudo, quanto a taxar/tachar. Mas garanto que vou continuar fazendo a separação acima, pois sou a favor da clareza e da distinção.
Mais ainda, adquiri uma nova e curiosa expressão: "ao cabo de contas". Inútil, diga-se, porque pretendo nunca empregá-la. Quanto a saboreá-la, são outros quinhentos.

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