São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
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Dólar mais fraco já ameaça globalização

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A polêmica do dólar fraco tornou-se um fato na semana passada. O FED resolveu não subir a taxa de juros, o Bundesbank baixou a sua. O Banco do Japão ainda tenta segurar a alta do iene comprando dólares, sem sucesso. Cresce a pressão, direta no Ministério das Finanças japonês, por uma redução explícita dos juros no Japão.
Comprando dólares ou reduzindo juros, os bancos centrais do Japão e da Alemanha tentam enfraquecer suas moedas.
Os japoneses partiram para o ataque ainda em outra frente: em meio a negociações sobre comércio com os EUA, tornaram público um relatório oficial condenando práticas protecionistas em vários parceiros, com ênfase na crítica à pressões dos EUA pela abertura unilateral dos mercados japoneses.
Nas últimas semanas, o que se observou foi um relativo desgaste da solidariedade internacional. A crise do dólar mostrou que a capacidade de intervenção coordenada dos maiores bancos centrais do mundo está mais limitada do que nunca. Diante da falência desse mecanismo mais simples e evidente de coordenação, ganha espaço o "salve-se quem puder".
Cada país, levando em conta principalmente os interesses domésticos, muitas vezes antagônicos frente aos princípios de cooperação global, acionará suas políticas econômicas para enfrentar a crise. Para países como Alemanha e Japão, cujas economias são poderosas máquinas exportadoras, o dólar mais fraco é ameaça vital.
A decisão brasileira de elevar tarifas de importação, nesse contexto, é uma gota no oceano que certamente contribui para torná-lo mais escuro. Mas está em sintonia com um problema global que recoloca em cena, em cada país, a defesa de prioridades locais e regionais. A globalização é um processo econômico irreversível, mas as formas de lidar com ela estão longe da unanimidade.
Se o problema cambial brasileiro tem origem em decisões internas, em sintonia com o Plano Real, a mudança externa é hoje tão grave que o aumento das barreiras protecionistas ou os esforços rumo à desvalorização estratégica da moeda não serão isolados.
A principal dúvida agora é quanto ao limite desse processo neoprotecionista e regionalista. A Organização Mundial do Comércio, funcionando oficialmente há poucos dias, está sendo dirigida por um italiano conhecido mundialmente por simpatizar com medidas menos liberais. Era esta, aliás, a razão pela qual o governo dos EUA se opunha à sua nomeação para o cargo.
Mas nos Estados Unidos a prioridade agora é outra. O FED começa a ver sinais de desaceleração na atividade econômica e por enquanto se dá por satisfeito com o nível de juros, dando de ombros com relação à desvalorização global do dólar.
E o presidente Clinton está ocupado com a negociação do Orçamento federal, numa guerra de trincheiras contra os republicanos, que faz a negociação brasileira de emendas orçamentárias parecer encontro de freiras carmelitas.
Num momento em que cada país parece mais atento ao que ocorre dentro das próprias fronteiras, o ideal de uma economia globalizada ganhará ingredientes mais fortes de pragmatismo e egoísmo.

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