São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
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O Nobel aprende a vestir saia

VANESSA DE SÁ
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Elas eram mulheres. E pesquisadoras. Algumas foram proibidas de usar o banheiro do centro de pesquisa onde trabalhavam, isoladas em porões. Muitas ficaram até 12 anos sem receber um salário, mesmo trabalhando dia e noite nos laboratórios. A outras, foi negado o prêmio Nobel, num atestado explícito do machismo vigente no começo do século.
"Mulheres que ganharam o prêmio Nobel em Ciências", de Sharon Bertsch McGrayne, traz a história do cotidiano das 14 cientistas que mais se destacaram neste século em alguns campos da ciência, como genética (Barbara McClintock), bioquímica (Gertrude Elion) e física (Marie Curie, Chien-Shiung Wu). O livro (410 págs, R$ 39,00) foi recentemente lançado pela editora Marco Zero.
Mais do que narrar as peripécias dessas mulheres, a autora mostra que a história recente da ciência foi fundamentalmente escrita por homens: até 1988, apenas 9 mulheres ganharam um Nobel, contra mais de 300 pesquisadores já premiados.
Para McCgrayne, o establishment científico por muito tempo recusou a entrada de mulheres.
O físico alemão Max Planck chegou a comentar: "Devo admitir que as admissões de mulheres a meus cursos são exceções. Normalmente, nunca é demais enfatizar que a natureza prescreveu às mulheres a função de mãe e dona-de-casa e que as leis da natureza não podem ser ignoradas sob nenhuma circunstância sem graves perigos -que, no caso em questão- se manisfestaria na geração seguinte".
Para aquelas que conseguiram ingressar nos grandes centros de pesquisa -muitas tiveram aulas particulares para suprir as deficiências do ensino básico, voltado à preparação para o "casamento"- o meio acadêmico se mostrou implacável.
Prova disso são as piadinhas sobre "preferências sexuais" (Emmy Noether era chamada de "der" Noether, com o artigo masculino em alemão) e a proibição de casarem, com o ameaça de serem demitidas (Barbara McClintock).
Mesmo sofrendo discriminações, a autora tenta mostrar o triunfo de mulheres, que antes de mais nada, gostavam do que faziam.
Elas simplesmente vibravam com suas descobertas, porque estavam fazendo algumas das mais importantes deste século.
Segundo McClintock, prêmio Nobel de Medicina em 1983 pela descoberta dos genes saltadores (transposons), antes de tudo "foi uma época muito divertida".

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