São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Especialista defendeu submersão de pinturas

DA REDAÇÃO

O francês Jean Clottes, que atestou a veracidade das pinturas de Ardèche, é no mínimo uma figura polêmica.
Presidente do Comitê Internacional de Arte Rupestre da Unesco -órgão das Nações Unidas relacionado à cultura e ciência-, ele escandalizou a comunidade científica no início de janeiro ao sugerir que as pinturas da região do vale do rio Côa (Portugal) fossem submersas, como medida de "segurança".
O governo português está construindo uma represa na região -localizada a cerca de 300 km de Lisboa- para movimentar as turbinas de uma usina hidrelétrica.
Quando a obra for concluída, o nível da água subirá cerca de cem metros, inundando as pinturas.
O conjunto de gravuras -com idade estimada em 20 mil anos- foi descoberto há seis anos pela companhia estatal de eletricidade EDP, responsável pela barragem, enquanto fazia o estudo de impacto ambiental.
Ele está sendo considerado o maior grupo de pinturas rupestres ao ar livre do mundo, com cerca de cem gravuras.
Não se sabe o número exato de pinturas, porque parte delas já foi submersa por uma outra barragem, construída mais à frente no rio, que elevou o nível das águas em 12 metros.
Mesmo assim, a empresa manteve a descoberta em segredo, contrariando o procedimento usual de divulgação.
Quando houve a denúncia de que as pinturas seriam alagadas, o governo tombou o conjunto, dando ao Instituto Português de Patrimônio Arquitetônico e Arqueológico o poder de interromper ou não a construção.
Com o parecer favorável de Clottes, as autoridades portuguesas decidiram prosseguir as obras da barragem.
Segundo o especialista, as pinturas ficariam mais seguras submersas, livres da ação de vândalos e de moradores da região -uma das mais atrasadas do país- que poderiam ver nas pinturas um entrave ao "desenvolvimento" econômico local, caso a construção da represa seja interrompida.
A idéia original era transformar o sítio arqueológico em um parque científico aberto à visitação pública, mas Clottes acredita que o governo português não investiria na preservação das gravuras, deixando que turistas as danificassem, como, a propósito, já fizeram com uma delas.

Texto Anterior: Um novo embuste científico?
Próximo Texto: "Artista" deve ter se baseado em fotografias
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.