São Paulo, quinta-feira, 6 de abril de 1995
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O diário de um assassinado

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - Digno de um emocionante roteiro cinematográfico, um diário secreto é capaz de arranhar ainda mais a imagem do Congresso -desta vez por causa de um assassinato, acompanhado pela Procuradoria Geral da República, envolvendo obras públicas.
Funcionário da Caixa Econômica Federal em Rio Branco (Acre), Vandervan de Souza Rodrigues, de 34 anos, tinha um diário secreto. Estou com cópia de certificado da polícia comprovando a autenticidade da letra.
Escreveu que estava marcado para morrer devido a seu envolvimento na licitação do Canal da Maternidade, realizada em 1991. Foram feitas acusações de que a obra foi superfaturada. "Estou ameaçado a morrer suicidado ou acidentado...", registrou.
Precavido, Vandervan, que participou da comissão de licitação, deixou no diário instruções à mulher caso fosse assassinado, quitou um imóvel e subiu em 1.000% seu seguro de vida. No dia 7 de julho do ano passado -cinco dias depois que o seguro passou a valer-, ele levou quatro tiros e morreu.
O diário cita vários grupos que desejariam sua morte. Entre eles, os mandantes do assassinato de Edmundo Pinto, governador do Acre, alvejado num quarto de hotel em São Paulo.
Deu o nome de pelo menos um suposto interessado em sua morte: Carlos Airton, ex-presidente da Companhia de Saneamento do Acre, candidato a deputado federal, que temeria suas revelações sobre o Canal da Maternidade.
"Sou totalmente inocente", disse ontem a esta coluna Carlos Airton, eleito pelo PPR do Acre. Para tentar mostrar sua inocência, alegou não ter sido sequer ouvido no inquérito policial que investigou o assassinato de Vandervan. Verdade. E aí entra o Ministério Público.
O Ministério Público do Acre enviou documento à Procuradoria Geral da República dizendo estranhar que, apesar de Carlos Airton ter seu nome citado no diário, ele não tenha sido ouvido pela polícia.
O documento informa que Carlos Airton é sobrinho do então governador do Acre, Romildo Magalhães, substituto do Edmundo Pinto -responsável, portanto, pela polícia.
PS - Aviso ao leitor: não estou acusando ninguém. Até aqui, o deputado é inocente. Mas o fato é que existe um diário, um morto e um suspeito que não foi chamado pela polícia.

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