São Paulo, domingo, 9 de abril de 1995
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Calmaria latina deixa o Brasil na berlinda

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Na semana passada, muita gente começou a falar na superação da crise latino-americana. Foi em parte ofensiva de marketing, mas também houve uma evolução favorável de alguns indicadores.
Os mercados reagiram com mais entusiasmo, com altas nos papéis de dívida latino-americana e reação nas Bolsas. Na Argentina, mais uma pesquisa confirmou o favoritismo de Menem na eleição, divulgou-se uma deflação e forte redução do déficit comercial.
O Brasil voltou a ser o patinho feio. Os "fundamentos" aqui ainda caminham no sentido oposto ao dos outros latino-americanos. O déficit comercial não só continua elevado como prosseguirá até junho, segundo a ministra Dorothéa Werneck. O governo aqui é derrotado no Congresso, enquanto Menem aprova até aumento de impostos. As saídas de capitais preocupam. O governo brasileiro pode amargar hoje ser visto novamente como diferente "para pior".
Algumas corretoras voltaram a recomendar papéis mexicanos. A melhoria relativa nos fundamentos, somada à percepção de que o pessimismo tem limites e à constatação de que os papéis latinos estão baratos demais, pode reforçar nas próximas semanas a calmaria dos últimos dias.
Há entretanto pelo menos dois aspectos que podem levar a nova inversão das percepções no médio prazo. De um lado, entre os mais animados com a normalização estão investidores que foram enterrados com papéis latinos.
São os "comprados" que não perderiam a chance de oxigenar os mercados, na pior das hipóteses para encontrar uma chance de se livrar do mico, vendendo melhor os seus papéis. Em suma, se há uma melhora relativa nos fundamentos, isso não significa que os especuladores simplesmente sumiram dos mercados.
O segundo aspecto a lembrar é que tanto no México quanto na Argentina o processo de ajuste mal começou, a recessão tende a piorar, corroendo receitas públicas, lucros, eventualmente quebrando empresas e instituições financeiras. Nesse processo de crise econômica e financeira os problemas de solvência externa podem voltar.
Especialmente na Argentina, o alívio de agora vem não apenas do FMI, mas também do aumento das exportações para o mercado brasileiro. Se o governo FHC afinal implementar seu próprio ajuste recessivo, o desequilíbrio comercial argentino será imediato.
Num prazo mais longo, portanto, a capacidade brasileira de gerar superávits comerciais sem aumentar o endividamento externo parece mais sólida. No México e na Argentina, o alívio financeiro imediato é mais visível e rápido. Mas eles estão se endividando mais sem tantas garantias de que possam no futuro pagar tudo o que devem. Resta saber se e quando os mercados vão se dar conta dessas diferenças estruturais.

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