São Paulo, sábado, 15 de abril de 1995
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Deixem a Vale em paz

ALMIR GABRIEL

As elites dirigentes brasileiras -tanto das classes opressoras como das oprimidas- devem à nação um projeto Brasil 2010. A democracia já parece constituir um bem da sociedade. A estabilidade econômica, outro bem, está sendo buscada a duríssimas penas. Ambas são indispensáveis para curar o mal maior das desigualdades entre classes sociais e entre regiões.
A ação conjunta do governo federal é indispensável para sinalizar e agir contra a patrimonialização do Estado, o corporativismo, a tecnoburocracia, o centralismo, e propiciar condições favoráveis para reforma fiscal, previdenciária, e redistribuir tarefas e competências entre os três níveis de governo. Enfim, modernizar o Estado, no sentido de torná-lo público e redutor de desigualdades.
Este projeto de Brasil, socialmente justo, fundamenta-se na sociedade e exige ações articuladas tanto no Executivo como no Judiciário e no Legislativo. Esta é uma agenda imensa que demanda tempo, paciência, confiança, decisão, oportunidade, participação.
Incluir nesta agenda temas não-prioritários é desservir à nação. Assim é a questão da privatização da Vale do Rio Doce. A empresa é uma organização que honra a capacidade de empreender, qualquer que seja a iniciativa, privada ou estatal. Hoje, respeita o ambiente, é eficiente, competitiva, lucrativa. E no Pará detém jazidas e pode dispor de energia e meios de transportes que lhe garantem maior lucratividade ainda, nas próximas décadas. Qual a vantagem de privatizar esse lucro? A quem interessa? Pode ser do interesse do governo?
A um governo socialmente comprometido interessa que esse lucro seja socialmente apropriado. Assim, no momento em que a Vale deixe de ser um enclave, nas regiões em que atua, e contribua para o desenvolvimento regional, ela passa a ser instrumento redutor de desigualdades regionais.
No instante em que ela facilite a verticalização da produção, pela industrialização da bauxita, ferro, cobre, ouro, prata, na região onde ela explora as minas, gera emprego. Ambos são objetivos de um governo democrático, que podem realizar-se eficientemente, sendo ela estatal.
Privatizada, esse lucro iria para onde os donos do capital resolvessem aplicá-los. Pelo tamanho da Vale, certamente a maioria do capital seria estrangeira, e é óbvio que o interesse de gerar empregos estaria lá fora.
Já é hora da tecnoburocracia deixar de ser instrumento do poder econômico. É hora de ajudar o Estado brasileiro a tornar-se público e redutor de desigualdades. E de não tumultuar mais o já agitado ambiente de reformas e de retomada do crescimento econômico-social, exigidas pelo povo brasileiro.

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