São Paulo, domingo, 16 de abril de 1995
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Descoberta dos oncogenes faz 20 anos

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Comemorou-se em janeiro último o vigésimo aniversário da descoberta dos oncogenes -genes que, quando ativados, provocam crescimento e proliferação celular, com ulterior cancerização.
Durante esse período realizaram-se numerosas pesquisas fundamentais que, inicialmente restritas ao papel desses elementos no câncer, acabaram abrangendo campos muito mais amplos, como a biologia geral, a neurobiologia, a imunologia, com extensão ao comportamento dos fatores de crescimento, aos hormônios, às enzinas etc.
Conhecem-se hoje cerca de 70 oncogenes bem definidos.
Oposta à dos oncogenes é a ação dos genes supressores, cujo estudo começou muito depois; eles impedem o crescimento e a multiplicação celular, mas quando suprimidos ou inativados, deixam o caminho livre à proliferação cancerosa.
Na verdade, a história dos oncogenes começou com a descoberta, por Peyton Rous, em 1911, de um tumor (sarcoma) de galinha transmissível por inoculação de suspensão ou filtrado do tecido tumoral, configurando a presença de um vírus.
Durante muitos anos Rous e outros cientistas examinaram o tumor e o vírus sob múltiplos aspectos.
Em 1970 vários pesquisadores detectaram no vírus de Rous um gene (src) responsável por sua capacidade cancerígena.
A grande novidade surgiu, porém, cinco anos depois, quando Michael Bishop, Harold Varmus e colaboradores, da Universidade da Califórnia em San Francisco (EUA), revelaram que o oncogene do vírus se acha presente em células normais de galinha.
Isto significa que em células normais se podem encontrar genes que, ativados ou "ligados", provocam o câncer.
O vírus, de algum modo, se contamina com o gene e o incorpora, quando infecta a célula. Tão importante descoberta mereceu o prêmio Nobel em 1989, partilhado também por Rous.
Bishop e Varmus demonstraram ainda que o gene src também se encontra em células de mamíferos. E começaram a investigar o que o gene faz normalmente na célula quando não se acha ativado ou sofre mutação.
Essas pesquisas explicaram muitos problemas relacionados com o processo da divisão celular e revelaram a produção de uma nova classe de enzimas reguladoras, que seriam uma das funções normais do gene.
Um dos oncogenes mais conhecidos e estudados é o ras, presente em pelo menos 30% dos cânceres humanos.
Pelo estudo desse gene os cientistas descobriram a existência de vários modos de ativação, um dos quais é a translocação, pela qual dois cromossomos trocam segmentos, sem falar dos meios químicos, como a adição ou troca de ácidos aminados (os elementos das proteínas).
Curioso e irônico é assinalar que o src, oncogene pioneiro, é o menos encontrado em tumores humanos.
Já referimos que os genes supressores agem em oposição aos oncogenes, o primeiro deles cronologicamente, é o do retinoblastoma, tumor ocular operável na infância, que todavia só foi clonado em 1986.
O descompasso entre as investigações sobre os dois tipos de genes está sendo, porém, vencido e ultimamente a pesquisa de genes supressores está muito acelerada, tendendo os dois campos a unir-se.
Um dos genes supressores mais conhecidos é o p53, que sofre mutação em até 50% de todos os cânceres humanos.
É muito recente a descoberta do BRCA 1, do qual depende a suscetibilidade ao câncer mamário.
Todos esses dados, inclusive a descoberta dos genes reparadores do DNA, reforçam a idéia de o câncer ser estimulado por mutações de genes.
Como diz Varmus, citado por Jean Marx ("Science", 261, 1940) "em 1994 há indicação incontroversa de que o câncer é doença genética".

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