São Paulo, domingo, 16 de abril de 1995
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Turbulência econômica não poupa economia americana

PAUL SAMUELSON

Primeiro foram as debilidades da libra britânica e da lira italiana, que dissolveram o sonho da união monetária européia até o fim do século.
Depois, a queda livre do peso mexicano encerrou a lua-de-mel a três entre Canadá, Estados Unidos e México.
Veio então a queda das bolsas nos mercados emergentes da Indonésia, da Tailândia e das Filipinas.
Especulando descontroladamente no mercado futuro de Cingapura, um garoto inglês de 28 anos conseguiu perder mais de US$ 1 bilhão num piscar de olhos.
Em consequência disso, quebrou o histórico Banco Barings de Londres e seus mais de dois séculos de reputação ilustre.
O que virá a seguir? Quando vai terminar?
Economista, ouço meu telefone tocando sem parar. Nunca se buscaram respostas com tanta ansiedade. Nem mesmo a toda-poderosa América foi poupada.
É verdade que o Produto Interno Bruto norte-americano cresce com vigor. A taxa de inflação se mantém relativamente sob controle. Mas isso não impede que, no mercado de câmbio, especuladores vendam dólar a descoberto e façam sua cotação baixar para escassos 90 ienes por dólar.
O Fundo Monetário Internacional não está sendo inútil. O Federal Reserve (o Banco Central dos EUA) não dorme no ponto.
Os principais bancos da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) -o Bundesbank, o Banco da Inglaterra, o Banco do Canadá- desenvolvem esforços conjuntos de estabilização. Mas o futuro ainda é um tanto incerto.
E na Europa, será que administram melhor esses problemas? Não se engane. Na França, com a dança das pesquisas de intenção de voto, mesmo o franco, supostamente forte, oscila ao sabor do vento. O general De Gaulle deve estar se revirando na cova.
O que dizer do meio-termo sueco? Há um quarto de século seu "welfare state (estado social-democrata baseado em medidas de bem-estar social) tenta se desembaraçar dos próprios excessos.
Dois governos conservadores, desesperados para retornar à economia de mercado, conseguiram apenas elevar a taxa de desemprego de enganadores 3% para o inequívoco patamar dos dois dígitos. Ao beijo do mercado seguiu-se uma redução drástica dos indicadores de produção suecos.
Há doze anos a coroa sueca sofreu uma maxidesvalorização. Mas o governo trabalhista da época desperdiçou qualquer possível efeito benéfico da desvalorização sobre a competitividade ao permitir a escalada dos preços e salários.
Recordemos alguns desses fracassos agora que Espanha e Portugal conseguiram da União Européia permissão para desvalorizar suas moedas. A peseta já vale sete centavos menos do que valia até recentemente. O escudo português ficou 3,5% mais barato.
O que tais mudanças significam para os não-economistas, nos dois países e no resto do mundo?
A primavera é adorável na península Ibérica. Os turistas podem invadi-la atrás de pechinchas -hotéis e restaurantes mais baratos, importação mais barata de xerez da Espanha ou vinho do porto mais barato de Portugal.
E a Espanha, com suas taxas de desemprego superiores a 20%, certamente necessita de ampliação da demanda e de maiores oportunidades de emprego. Um governo socialista austero talvez seja a força necessária para garantir que a recente desvalorização não será consumida pela inflação e tirar proveito dela? É preciso cautela.
Minhas dúvidas se aplicam de modo mais geral. Após oito meses de governo de uma coalizão de direita ignorante, a Itália tenta uma segunda chance com um governo tecnocrata de centro.
Dentro e fora do país, investidores vão ficando céticos quanto à possibilidade de redução do patológico déficit fiscal italiano. A estrutura ineficiente de regulamentações, gastos e impostos começará a ser reformada? O esfacelamento dos partidos políticos vai dar lugar a estruturas partidárias estáveis?
Não há respostas para essas perguntas nem nos melhores manuais de economia. A economia política é infinitamente mais complicada que a mera economia.
O ano de 1995 não é 1929. E a economia global não enfrenta agora uma recessão grave, como aconteceu entre 1990 e 1993. Na Alemanha e no Japão, uma certa recuperação parece estar em curso. É possível ter esperanças racionais no próximo ano e meio.
Em parte alguma, porém, o pensamento positivo trará bons resultados. Esses terão de vir, necessariamente, da execução de políticas sensatas de centro -ainda que muitas pareçam dolorosas.
Por que defender programas de centro e não a velocidade máxima rumo ao mercado livre e competitivo? O fato é que é importante evitar batalhas campais entre os sindicatos sob forte pressão e as direções das empresas.
A forte recuperação obtida pelos EUA deve-se ao fato de que os sindicatos perderam combatividade depois de duas décadas de forte competição das importações. Um dos pontos favoráveis na recuperação da Itália depois de sua exclusão do Tratado de Maastricht é a surpreendente colaboração dos principais candidatos.
A Espanha ainda precisa provar que pode deixar de lado as lutas de classes e os conluios de seu passado corporativo. E esse mesmo ponto de interrogação atormenta os cenários mexicano e latino-americano.

Copyright Los Angeles Times Syndicate
Tradução de Lúcia Boldrini

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