São Paulo, terça-feira, 18 de abril de 1995
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O cardeal e os preservativos

O cardeal e os preservativos
Caminhando num intricado labirinto, o arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo cardeal Arns, revelou, em sua mais recente entrevista concedida à Folha, publicada no domingo, uma notável capacidade de conciliar respeito à hierarquia e liberdade de consciência.
Se todo católico deve obediência irrestrita ao papa, o que não dizer de um cardeal-arcebispo. Nesse sentido, d. Paulo conseguiu tornar claras suas posições mesmo que difiram das propugnadas por Roma, aparentemente sem quebrar a hierarquia ou professar teses condenadas pela Santa Fé.
No emblemático caso do uso dos preservativos, firmemente proscrito pela Igreja Católica, d. Paulo advoga teses bastante lúcidas. Diz que quando é procurado por fiéis, explica a doutrina oficial da Igreja para depois acrescentar que usar ou não a camisa-de-vênus é uma questão de consciência individual.
O simples fato de o prelado afirmar não fazer oposição às campanhas do governo contra a Aids já seria motivo para comemoração; afinal, muitos clérigos não poupam esforços para tentar neutralizar a propaganda governamental.
D. Paulo vai além e traz para a discussão no âmbito da Igreja Católica um argumento bastante interessante. Do ponto de vista moral, diz o arcebispo, o indivíduo, quando colocado diante de dois males, deve escolher o menor. E a conclusão do cardeal não poderia ser mais lógica: "Se você usa camisinha, este é o menor mal. Se não, você mata -e você não é doido de matar, é?"
Na oposição de d. Paulo, vê-se um nítido exercício de liberdade de consciência. E o livre-arbítrio, a capacidade que cada um tem de decidir por si próprio, é justamente o que caracteriza a humanidade. É a sua perdição e a sua benção.

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