São Paulo, quarta-feira, 19 de abril de 1995
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Serjão, vem pro PT você também

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Se eu fosse o Lula, levaria hoje mesmo uma ficha de filiação ao PT para o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, mais conhecido como Serjão, assinar.
Afinal, nada mais petista do que considerar "masturbação sociológica", como o fez ontem o ministro, essa história de ficar discursando sobre a miséria e colecionando estatísticas fúnebres sobre ela, em vez de agir para ao menos atenuá-la.
É verdade que o PT também se especializou no discurso e lhe falta a prática, mas, pelo menos, pode alegar que ainda não conseguiu chegar ao governo federal, teoricamente a única posição a partir da qual seria possível de fato uma ofensiva contra a miséria.
Já o velho Serjão chegou lá, mas nem por isso mudou o discurso. Se algum petista, pedetista ou membro do PC do B dissesse que o governo nada fez até agora na área social, o presidente retrucaria que é nhenhenhém ou coisa da "falsa esquerda".
Fico muito curioso por saber como Fernando Henrique Cardoso vai catalogar seu amigo Serjão depois dessa demolidora crítica. Aliás, o ministro não ficou nela. Disse ainda que o governo fez muita "besteira" na área política, no encaminhamento das reformas constitucionais.
Agora dá para entender o empenho do governo em cooptar deputados do PMDB, do PPR e de outros partidos menores, para formar maioria no Congresso. Um governo capaz dessa autoflagelação pública dispensa mesmo a oposição. Afinal, ninguém da oposição tem a "inside information" necessária para lhe conferir autoridade para qualificar de "masturbação" a política social do próprio governo.
Depois, o pessoal do governo ainda reclama da Folha. Que eu me lembre, ninguém deste jornal usou a palavra "masturbação" para designar a ação (ou falta dela) do governo em qualquer área. "Besteira", tampouco.
Só falta agora o Lula sair em defesa do presidente, ponderando que é injusto cobrar do governo mais ação e menos "masturbação".
Do jeito que as coisas vão, começo a desconfiar que, dentro de três anos e oito meses, o Serjão estará fazendo as mesmas críticas. Seria engraçado, não fosse tão trágica a situação social.

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