São Paulo, sábado, 22 de abril de 1995
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Cantora mostra onde a gente quer morar

ZECA CAMARGO
EDITOR DA ILUSTRADA

Eu quero morar no país que Marisa Monte canta.
É de lá que vêm os sons que ela reuniu no seu novo show, capazes de exercer um fascínio que não se vê há tempos no palco.
A chave é identificação: um estranho processo que faz com que a sintonia de algo distante como um monjolo te leve a um súbito prazer de fazer parte daquela lindeza brasileira que Marisa traz ao palco.
No caso desse show, talvez a expressão "para o povo" possa ser melhor entendida como "em nome do povo". E aí Marisa não poderia ter sido mais fiel.
Seu show é "das gentes" que Marisa viu quando resolveu sair do "chiquê" que ela havia adotado desde a sua aparição.
É das pessoas que Regina Casé cruza no seu "Brasil Legal". É dos nomes que Caetano junta, das origens que Chico Buarque canta, da poeira que Carlinhos Brown levanta. É da horrenda cor-de-rosa que deixa muita vida mais alegre.
Marisa vai até os clichês para poder liberá-los. E é fácil dizer que ela usa recursos fáceis.
Mesmo que seja, dá para esquecer. Vestida de tecidos orientais, Marisa se mostra mais brasileira do que o sambinha que ela dança.
Nem timbalada nem pagode, forró sem ser folclore, Marisa está mais moderna do que talvez ela quisesse ser. Por isso a idéia elaboração premeditada (se é que houve) cai por terra.
Luiz Gonzaga mais teatro de fantoche é igual a mais do que uma simples gracinha. Evocação de Paulinho da Viola não fica com cara de tributo piegas.
Canta ela, a certa altura: "O céu fica em cima do teto". Pelo menos para o público que urrava na estréia, Marisa conseguiu trazer ele para baixo -fazer dele um Brasil.
Eu ainda vou descobrir onde é que essa sua inspiração mora. E eu vou mudar para lá.

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