São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
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Empresa acaba com 'pedra brilhante' de Drummond

HÉLCIO ZOLINI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM VITÓRIA

A Companhia Vale do Rio Doce é responsável pela destruição de um ícone da poesia brasileira.
A Vale mudou a face de Itabira (150 km a nordeste de Belo Horizonte), em Minas Gerais, cidade onde nasceu há quase 53 anos -e onde nasceu também o poeta Carlos Drummond de Andrade.
O pico do Cauê, presença constante na obra de Drummond, foi o local da primeira mina da Vale do Rio Doce.
Hoje, o pico já não existe mais. Em seu lugar, surgiu uma cratera de forma elíptica de 2,5 quilômetros de extensão por 1 quilômetro de largura.
Quando a Vale começou a atuar em Itabira, o pico dominava a cidade com seus 1.400 metros de altitude.
Era uma referência na região e o responsável pelo nome de Itabira -que significa "pedra brilhante", em tupi-guarani.
Atualmente, o buraco tem seu piso a uma altitude de 800 metros, muito abaixo da cidade.
A mina do Cauê, segundo estima a direção da empresa, estará esgotada em 1999.
Até lá, o ponto onde ficava o pico será ainda mais escavado, baixando a uma altitude de 700 metros.
As demais minas que circundam a cidade deverão estar esgotadas até 2028, caso continuem sendo exploradas no ritmo atual de 35/40 milhões de toneladas anuais.
"É como se tirassem o Pão de Açúcar do Rio de Janeiro", compara o prefeito da cidade, Olímpio Pires Guerra (PDT).
Explosões
A Vale é onipresente na vida de Itabira. É verdade que já foi mais.
Os itabiranos se livraram com alívio, há algum tempo, das explosões das 10h30, que diariamente, durante 40 anos, sacudiram a cidade. Até hoje, muitas casas enfrentam problemas de rachaduras causadas pelas explosões de dinamite.
Mas é incessante o trabalho na mina e o movimento de trens.
Todo dia, quase de hora em hora, 17 trens da Vale, com 80 vagões cada, deixam a cidade com destino ao porto de Tubarão (ES) carregando 101 mil toneladas de minério.
A presença da Vale significa, também, poluição.
A cidade está coberta pelo avermelhado do pó de minério.
Os índices de doenças respiratórias na cidade são elevados.
A própria Vale do Rio Doce financia uma pesquisa para avaliar qual a relação entre as doenças e o impacto que suas atividades extrativas causam no local. A Vale responde por quase 80% da arrecadação municipal. Dos R$ 51 milhões de orçamento da cidade em 95, R$ 31 milhões são da Vale.

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