São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Guardemos o piloto como se guarda um tesouro

TASSO JEREISSATI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Tenhamos fé em que cada vez mais brasileiros alcancem por mérito o pódio do reconhecimento nacional. Quanto mais numeroso for o elenco e mais ampla a gama de atividades em que se distribua, mais claro será o indício de que andamos bem.
Sejamos esperançosos -muito esperançosos- para imaginar que surjam outros fenômenos como Ayrton Senna.
Após 12 meses, a recordação é forte e nítida. Hoje, parece-me ainda mais impressionante a comunhão que vivemos no adeus final ao jovem herói.
Experimentamos ali um Brasil unido pela solidariedade.
Onde estavam naqueles momentos as teses separatistas? Onde estavam os preconceitos? Nada disso havia. A nação estava abraçada no mesmo sentimento. A reverência a Senna nos fazia imensamente brasileiros.
Senna era o Brasil.
Não restrinjo com este pensamento o alcance do magnetismo de um ídolo que arrebatou multidões pelo mundo afora.
Apenas procuro distinguir o tipo de fascínio que ele despertava entre nós brasileiros.
Senna encantava em qualquer parte porque era um super-homem extremamente humano -combinava a capacidade de superar limites com uma simplicidade cativante.
Mas a nós oferecia de sobra demonstrações de amor ao Brasil, de tal maneira que o seu sucesso ungia-se como uma expressão da capacidade do país.
Com seu jeito singular, ele se colocou não como alvo final da vibração da torcida, mas sim como um veículo que conduzia a aspiração coletiva ao seu destino, aos nossos olhos grudados na tela de vídeo, ele era -como no verso de Caetano- a presença que mantém sempre teso o arco da promessa.
Ayrton sempre nos deu de fato as suas vitórias. Fazia isto com gestos de sinceridade indubitável (é só fazer uma pausa e fechar os olhos para deixar vir à tona os fatos que testemunham isto).
Acompanhando a sua trajetória, aprendemos que esta oferenda de si mesmo emanava de um caráter generoso e de um forte sentimento nativista. E esta percepção sustentava um vínculo direto com cada telespectador. Ele, uma antena de sentimentos, transmitindo e captando de volta um saudável orgulho de ser brasileiro.
Por uma inconfidência de não sei quem, acabamos sabendo que, nos intervalos entre as corridas, ele atuava em outro nível de interação social como benfeitor invisível de dezenas de desamparados.
Agora, esta sua faceta está de volta em uma fundação com seu nome.
Viva a Fundação Ayrton Senna! Que seja mais uma expressão da presença dele entre nós.
Guardemos Ayrton Senna como a um tesouro. Ele fez muito por nós. E com tanto entusiasmo, que continua e continuará fazendo.

Texto Anterior: Após um ano, Senna continua como herói
Próximo Texto: Nem os diamantes são para sempre
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.