São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
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De como Serra voltou à UNE

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO-Neste mundo em que as imagens vão substituindo paulatinamente o raciocínio e em que a realidade virtual eclipsa aos poucos a realidade real (perdão, Josué Machado), a construção de imagens dos homens públicos está se aproximando do mais total absurdo.
O caso de José Serra, ministro do Planejamento, é talvez o mais emblemático. Serra nasce para o público como presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), em 1964. Logo, está associado à quintessência do radicalismo.
Seus anos de exílio não ajudaram a retificar a imagem, ainda mais que parte dele foi passado no Chile de Salvador Allende, outra figura cuja imagem está associada ao radicalismo.
Só ao exercer a Secretaria de Planejamento de São Paulo é que a imagem de Serra vira do avesso. Passa a ser o "Delfim Netto do PMDB", qualificação que ele odeia. Hoje, já não faz mais sentido porque Delfim deixou o poder faz 10 anos e Serra saiu do PMDB há sete.
Mas a idéia por trás do epíteto, a de um economista ortodoxo, permaneceu. Até fortaleceu-se nos oito anos de mandato como deputado. Contribuiu para tanto o fato de Serra ser um obcecado pelo equilíbrio nas contas públicas, o que é sinônimo de conservadorismo para setores da esquerda.
Foi esse Serra que chegou ao Ministério do Planejamento. Mas ele não existe mais aos olhos de um fatia importante do empresariado.
De um deles, ouvi faz pouco a afirmação de que Serra estava à esquerda de Aloízio Mercadante, o candidato a vice de Lula. A princípio, achei que era apenas uma maneira de agredir dois personagens com uma só frase, já que ambos, com certeza, odiarão a comparação.
Depois, descobri que a imagem de Serra entre ponderável fatia dos homens de negócios está deteriorada, porque suspeitam que ele é inimigo da abertura e das privatizações.
Bem feitas as contas, Serra voltou, 31 anos depois, à presidência da UNE, ao menos no imaginário de um setor influente da sociedade. É fantástico.

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