São Paulo, quarta-feira, 26 de abril de 1995
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A farra da inteligência

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Intelectual é fogo. O sujeito tem em casa duas estantes com livros, volta e meia publica um artigo nos segundos cadernos da vida, torna-se sócio-correspondente de algum grêmio ou academia, tem vaga noção de quem foi Weber ou Lacan -e temos mais um intelectual na praça. Gosta muito de viajar, sobretudo em bocas-livres.
O deputado Augusto Carvalho (PPS-DF) revelou semana passada alguns gastos secretos do governo, que é tido de intelectuais pelos intelectuais acima descritos. Só de passagens internacionais, a turma gastou R$ 1,16 milhão no primeiro trimestre deste ano, contra míseros R$ 162,9 mil em igual período do ano passado. Juiz de Fora fica mais perto do que Nova York, Paris, Roma e Londres.
Mas nem só de viagem vive um intelectual que se preze. Ele tem de se comunicar. Em vez de receber uma paga pelo ofício (o que seria funcional e decente), ele paga a comunicação que faz. As despesas do atual governo no mesmo período (primeiro trimestre de 1995) foram de R$ 11,2 milhões contra R$ 1,27 milhão do ano passado. E ainda botaram para fora o Muylaert que não gastava o suficiente para comunicar-se.
Do jeito que a coisa vai, não serão necessários grandes esquemas financeiros, tipo Operação Uruguai, para manter azeitada a farra da inteligência oficial.
O consolo é que, desta vez, madame não está gastando demais -acusação feita à ex-primeira dama. Todos estão se comunicando lá fora, divulgando o Brasil e explicando que não somos o México.
Com a facilidade de editar e reeditar medidas provisórias que valem como lei com o dinheiro do Fundo Social de Emergência, que tapa qualquer aflição de caixa, o governo pretende gastar mais na campanha publicitária pelas reformas, campanha que nem sequer começou.
Ainda teremos o Serjão analisando a obra de Weber no horário nobre. E alguns ministros procurando nos arquivos e tombos da Europa as causas que provocaram a Revolta dos Alfaiates e a Guerra dos Farrapos.

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