São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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Japonês puro é raridade na 4ª geração de descendentes

THAÍS OYAMA
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Japão se dilui no Brasil. Com o crescimento do número de casamentos entre japoneses e brasileiros, os nikkeis (descendentes "puros", filhos de pai e mãe japoneses ou também descendentes) parecem estar fadados à extinção.
Pesquisa do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, realizada em 1988, prevista para ser publicada este ano e divulgada com exclusividade pela Folha, aponta que a maioria dos representantes da quarta geração de japoneses no Brasil (os ionseis) é mestiça, filha de nikkeis com brasileiros, e não mais de nikkeis com nikkeis.
É a primeira vez que o fenômeno ocorre. Até a terceira geração (sansei), o índice de miscigenação entre os descendentes era de 42%, ou seja, os mestiços ainda existiam em menor número do que os descendentes puros. Agora, entre os ionseis, a situação se inverte: o índice atinge 61%.
O motivo é o aumento do número de casamentos mistos no país. Em São Paulo, até 1960, só 11% dos casamentos na comunidade japonesa envolviam um brasileiro.
Na época o Japão era um país tão distante que a visão de um casal misto se transformava em atração pública -e o abismo cultural produzia situações insólitas.
Como no caso da descendente de italianos e escritora Ana Suzuki, que, casada há 23 anos com o imigrante japonês Tadao Suzuki, passou anos guardando os livros do marido de cabeça para baixo, confusa com o alfabeto.
Hoje a porcentagem de casamentos mistos é quase cinco vezes maior que na década em que Suzuki chegou ao Brasil: 63,5% em 88.
Para a professora Yoshia Nakagawara, da Universidade de Londrina, um dos motivos para o crescimento é a urbanização dos nikkeis -hoje 1,2 milhão no país.
Segundo ela, 90% dos integrantes da comunidade nipônica no Brasil residem em cidades. "A urbanização facilita o inter-relacionamento racial."
A psicóloga Fumiko Nakano, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de SP, acha que o aumento do número de casamentos mistos pode significar um "amadurecimento" dos descendentes em sua relação com a própria etnia.
"Quando as pessoas se assumem e se sentem bem com suas características e peculiaridades, se permitem com mais facilidade relacionar-se com o diferente, sem temer perder a identidade", diz.
O aumento do número de casamentos mistos pode provocar, entre membros da comunidade japonesa, um misto de perda e abandono da identidade cultural.
Paradoxalmente, é fato que o mesmo fenômeno contribuiu para a disseminação da cultura japonesa no Brasil. O Japão se dilui no Brasil. E os japoneses se sentem cada dia mais em casa.

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