São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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Às escuras

O caso do Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) está precisando urgentemente de um vigoroso banho de transparência. Apesar de envolver a astronômica quantia de US$ 1,4 bilhão de recursos do contribuinte, o episódio parece tanto mais nebuloso quanto mais informações são divulgadas.
As dúvidas, é verdade, surgiram desde o início. Não houve concorrência para fornecimento dos equipamentos porque, alegou-se, o serviço era sigiloso e envolvia segurança nacional. Curiosamente, dossiês do projeto foram enviados a 16 embaixadas para serem repassados a empresas de seus países.
Há ainda um detalhe no mínimo curioso: o jornal "The New York Times" informou que a Raytheon ganhou o contrato porque a CIA denunciou ao Planalto supostas propinas pagas a funcionários brasileiros pela firma francesa Thomson, concorrente da Raytheon. Outras denúncias creditam a vitória da Raytheon à pressão dos EUA.
No lado nacional o caso não causa menos estranheza. A Esca foi indicada para gerenciamento do sistema também sem licitação sob o argumento de que apenas ela possuía a experiência exigida, além de ser idônea e de dispor da total confiança do Ministério da Aeronáutica. A empresa, de fato, mantém há tempos uma relação muito próxima e peculiar com o governo e acumulou a experiência requerida dominando grandes projetos públicos de tecnologia de satélites e radares no país -não raro sem licitação.
Pois descobriu-se há pouco que a Esca está sendo acusada pela Previdência de ter falsificado o recolhimento de contribuições. É estranho (para dizer o menos) que uma empresa suspeita de fraude contra os cofres públicos seja considerada idônea e merecedora de confiança do governo sem que o caso esteja cabalmente esclarecido.
Esse é aliás dever básico do governo, ainda mais no caso de um projeto de tal magnitude e importância. O episódio da Previdência é só a ponta de um verdadeiro iceberg de dúvidas e de acertos feitos sem a indispensável transparência.
Dar sequência ao contrato e comprometer tanto dinheiro público sem que se aclarem as suspeitas seria uma mostra de descaso do governo face a suas responsabilidades e de desrespeito para com toda a população. No mínimo.

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