São Paulo, domingo, 30 de abril de 1995
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Técnicos do FMI fazem críticas duras ao Brasil

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Na semana passada o FMI, através de seu diretor-gerente, Michel Camdessus, declarou que os riscos de contágio da crise mexicana, ou o que ficou conhecido como "efeito tequila", estão descartados. Aliás, foi uma semana de alívio generalizado.
Os países ricos se reuniram para reafirmar a confiança na estabilidade do dólar, os alemães reduziram os juros e novos números sobre o desempenho da economia norte-americana praticamente eliminam a possibilidade de alta dos juros nos EUA no curto prazo.
Os elogios públicos ao plano econômico brasileiro, de autoridades do FMI e de outras instituições, têm sido frequentes nas últimas duas semanas. Talvez seja possível, olhando os últimos meses, especialmente o que aconteceu na América Latina, afirmar que nunca se viu tamanha operação de salvamento.
México e Argentina foram rapidamente socorridos e aumenta a cada dia a sensação de que o incêndio não vai mesmo se alastrar. Haverá ajustes recessivos, mas o esforço para evitar que os fundamentos do ajuste liberalizante sejam abalados é sem dúvida notável. O Brasil continua sendo o único patinho feio.
É claro que nenhuma autoridade internacional torce contra o Plano Real. Mas talvez seja interessante olhar mais de perto o que dizem os técnicos do Fundo em estudos que naturalmente refletem apenas as suas opiniões "e não necessariamente as do Fundo ou do Banco Mundial".
Em artigo publicado no número de março de 1995 da revista "Finanças e Desenvolvimento", do FMI e do Banco Mundial, o Brasil aparece no final de um artigo dedicado aos processos de dolarização em países em transição do socialismo ao capitalismo.
Ratna Sahay e Carlos A. Vegh, do departamento de Pesquisas do FMI, mostram que nas ex-economias de planejamento centralizado a dolarização foi uma etapa rumo à constituição de economias de mercado.
Para os economistas do FMI, a experiência da América Latina indica que "combater a dolarização com medidas artificiais" -como recorrer a instrumentos financeiros indexados, pagar juros sobre ativos de alta liquidez que são usados como dinheiro- no final das contas "só contribui para exacerbar futuras explosões inflacionárias".
O figurino cabe como uma luva na economia brasileira, depois do Plano Real inclusive. Os técnicos do Fundo alertam: o Brasil é um bom exemplo de que "atacar os sintomas do mal e não suas causas pode muito bem piorar a situação".
A crítica prossegue dizendo que o Brasil "constitui um bom exemplo de como combater "com êxito" a dolarização, sem contudo solucionar problemas fundamentais.
A política de altos juros reais funciona no curto prazo mas, combinada com déficits fiscais crônicos, não ajusta a economia.
Bem, parecia apenas um artigo para tratar da Mongólia, Lituânia, Estônia e outras economias em transição. O teor e a atualidade das críticas ao Brasil, entretanto, mostram que dentro do FMI a consciência do impasse brasileiro é bem maior do que transparece nas declarações oficiais.

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