São Paulo, sexta-feira, 5 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Em casa

CLÓVIS ROSSI

LONDRES - O maior risco que Fernando Henrique Cardoso correrá em Londres é o de ser confundido com Tony Blair, o novo líder do Partido Trabalhista britânico, no posto há menos de um ano. Os trabalhistas são os sociais-democratas em versão inglesa.
O risco começa pelo fato de que Blair também é eterno portador de um ``sorriso de aeromoça", para usar a cáustica descrição de FHC feita pelo então governador Antônio Carlos Magalhães, hoje aliado do presidente.
E continua pelo revisionismo que Blair vem fazendo de posições históricas do trabalhismo britânico. Na semana passada, obteve dos filiados e com boa maioria o enterro da cláusula 4 da Constituição trabalhista (aqui programa partidário ganha o nome de Constituição).
É (ou era) a cláusula que previa a estatização de todos os meios de produção, remota herança marxista, adotada há 60 anos pelos trabalhistas. É claro que a cláusula já havia caído em desuso, mas o fato de Blair ter batalhado arduamente pelo seu sepultamento oficial tem todo um simbolismo.
Há mais semelhanças: os novos trabalhistas garantem que, se chegarem ao poder (do qual estão afastados desde o já remoto ano de 1979), vão melhorar a quantidade e a qualidade dos serviços públicos e sem aumentar impostos. É mais ou menos a mágica que FHC prometeu aos brasileiros.
Para fechar o círculo, há o fato de que Blair, como FHC, vende as novas idéias (liberais, centristas ou conservadoras, como se queira chamá-las) como revolucionárias e chama de reacionários os esquerdistas remanescentes que defenderam a cláusula 4.
Em sendo assim, FHC vai se sentir em casa, seja com o anfitrião, o conservador John Major, seja com o principal candidato a sucedê-lo, Tony Blair.
E não só por isso: a tuberculose, depois de declinar durante um século, voltou a aumentar na Inglaterra (16% de crescimento desde 87). Causa maior: a pobreza (o crescimento se deu, todo ele, nos 30% mais pobres da população). Faz já 16 anos que a Inglaterra se tornou campeã mundial de neoliberalismo, primeiro com Margaret Thatcher e agora com John Major.

Texto Anterior: Recomeça o pesadelo
Próximo Texto: Cutucando um tabu
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.