São Paulo, domingo, 7 de maio de 1995
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Leia íntegra da proposta

A seguir, a íntegra do documento ``Proposta de uma reforma tributária e de um novo sistema de relações do trabalho":

Proposta de uma reforma tributária e de um novo sistema de relações do trabalho
Reforma tributária
1. Justificativa
As entidades reunidas consideram a reforma tributária como uma prioridade para a nação, por diversas razões. Em primeiro lugar, é uma condição essencial para a consolidação da estabilização da economia. Em segundo lugar, é absolutamente necessária para a superação da crise do financiamento do Estado e para reverter a degradação da infra-estrutura produtiva e social. Em terceiro lugar, e em decorrência, é condição também vital para a retomada do crescimento econômico e, portanto, para a criação de empregos. Em quarto lugar, a reforma tributária é inadiável para garantir competitividade dos bens e serviços produzidos no país, que, no momento, estão desnecessariamente onerados pela atual estrutura de tributos. Finalmente, a reforma tributária é essencial para reduzir o nosso dramático problema de distribuição de renda, já que somente um Estado que arrecada adequadamente seus impostos pode financiar políticas sociais.
A Constituição deve ser sintética na questão tributária e, ao mesmo tempo, deve garantir direitos básicos dos contribuintes. Para tanto, os dispositivos tributários constitucionais devem expressar princípios permanentes que protejam os contribuintes -cidadãos e produtores- contra arbitrariedades e casuísmos do poder público. A simplificação constitucional deve ter o objetivo de defender o contribuinte e estabelecer uma racionalidade e uma permanência para a estrutura tributária.

2. Processo
Por ser tão necessária, e por interessar à sociedade como um todo, a reforma tributária deve ser conduzida por meio de um processo amplo de discussão e negociação, que lhe garanta atributos de legitimidade, estabilidade e equidade.
Nesse sentido, as entidades aqui representadas vêm apresentar suas recomendações para um projeto de reforma tributária. Dentro dessa ótica, a desconstitucionalização de dispositivos tributários não deve ser uma forma de impedir a formulação negociada da reforma tributária. A urgência da reforma não pode ser um pretexto para excluir os atores sociais do processo de sua discussão.

3. Princípios
As entidades recomendam que sejam considerados os seguintes princípios:
a) Progressividade: a estrutura tributária deve ser um instrumento para financiar as atividades públicas e, principalmente, deve contribuir para a melhoria do perfil de distribuição de renda. Para tanto, todos os tributos devem obedecer ao princípio básico da progressividade. Quem aufere mais renda deve pagar progressivamente, alíquotas marginais maiores. Da mesma forma, no imposto sobre o consumo, admite-se seletividade nas alíquotas, aplicadas segundo o princípio da essencialidade do bem ou serviço. O princípio da progressividade deve, entretanto, ser compatibilizado com a necessidade de proteger o contribuinte e de estimular os investimentos no país.
b) Ênfase nos impostos diretos: como decorrência do princípio anterior, a nova estrutura tributária deverá se ancorar prioritariamente em impostos diretos. Para tanto, o novo sistema deverá permitir que gradualmente a massa tributária se concentre no Imposto de Renda, invertendo a atual concentração em impostos indiretos. Este objetivo deve ser perseguido em especial, via aumento da base tributária, pela incorporação de setores que hoje estão fora do alcance do fisco. A redução dos impostos indiretos deverá ainda ser compensada pela maior participação na arrecadação dos impostos sobre a propriedade e dos impostos sobre ganhos de capital realizados por ocasião das transferências a título gratuito intervivos e causa mortis, os quais deverão ser incorporados à base de cálculo do IRPF - Imposto de Renda da Pessoa Física.
c) Federalismo fiscal: a estrutura tributária pode contribuir (ou prejudicar) à participação política dos cidadãos. Uma estrutura centralizada e pouco transparente, como a atual, tende a alienar os cidadãos da questão do uso dos recursos públicos. Por outro lado, uma estrutura descentralizada, com uma clara definição de bases tributárias para cada nível de administração, permite ao cidadão a identificação dos deveres e obrigações de cada governo. Essa é uma condição importante para abrir espaços para uma maior participação política e controle social dos gastos públicos. Por essa razão, as entidades recomendam que a nova estrutura tributária tenha o objetivo de fortalecer o federalismo fiscal.
d) Competitividade: a estrutura tributária, entre outros elementos sistêmicos, deve desonerar as exportações, favorecendo a inserção de produtos brasileiros nos mercados internacionais. Deve também permitir que eles possam competir com similares estrangeiros no mercado interno. Por outro lado, deve se preocupar igualmente em desonerar os investimentos produtivos. É, portanto, um instrumento estratégico para a preservação e geração de empregos. Para tanto, os tributos não devem incidir em cascata, e sua estrutura e incidência devem minimizar os custos financeiros das empresas contribuintes, bem como os custos públicos e privados da arrecadação. Por todas essas razões, a estrutura tributária deverá contribuir para reduzir os preços finais pagos pelos consumidores. A reforma deve caminhar para a substituição do ISS, IPI e ICMS por um imposto sobre o consumo, de competência estadual, arrecadado segundo o critério de destino. Esse imposto, além de proporcionar uma melhor distribuição regional da arrecadação, eliminaria as causas da guerra fiscal na qual as unidades da Federação estão atualmente envolvidas. A opção entre o imposto monofásico sobre vendas no varejo (IVV) e o imposto multifásico sobre o valor agregado (IVA) será também de competência soberana de cada unidade da Federação.
e) Simplificação da estrutura tributária: o número de tributos deve ser substancialmente reduzido, dentro do princípio de simplificar a estrutura e alargar as bases de arrecadação dos impostos remanescentes. Esse princípio deve promover a simplificação e maior eficiência da arrecadação, além de proporcionar maior transparência em todo o processo tributário.
f) Combate à sonegação e à evasão fiscal: num ambiente em que todos pagam seus tributos, a carga é melhor distribuída, adequando-se à capacidade contributiva dos cidadãos e empresas. Além disso, a permissividade em relação à sonegação acaba por destruir o princípio da competição: o sonegador compete com vantagens contra o pagador de impostos, além de acumular patrimônio pessoal às custas do bem-estar da sociedade. Por essas razões, o governo, nos seus três níveis, deve adotar políticas firmes e permanentes de combate aos sonegadores. A simplificação da estrutura tributária deve contribuir para minimizar a existência de brechas legais. Com isso, criam-se condições para inibir a prática da evasão e do planejamento fiscais. Para tanto, o aparato arrecadador deverá ser adequado para atender as necessidades e expectativas que serão criadas a partir da reforma tributária, permitindo que o sistema atinja os padrões de justiça, transparência e equidade compatíveis com uma sociedade democrática.
Sistema de relações de trabalho
O sistema de relações trabalhistas não é adequado aos dias de hoje, caracterizando-se por uma tradição corporativista e uma legislação extensa e desatualizada e um funcionamento muito dependente da tutela do Estado.
Devido a esses aspectos, muitas vezes torna-se difícil encontrar soluções conjuntas para os conflitos entre capital e trabalho e entre o Estado e seus servidores, por meio de processos mais democráticos.
Diante dessas considerações, as entidades signatárias propõem uma transformação desse modelo para um novo sistema trabalhista capaz de assegurar eficácia à utilização de instrumentos que priorizem soluções negociadas dos conflitos laborais, que promova um maior equilíbrio nas relações entre capital e trabalho e onde o Estado cumpra o seu papel de fiscalizador e de responsável pela vigência plena da cidadania.
Este novo modelo deve ser consequência de um processo negocial que construa as novas regras e garanta, durante a transição, a vigência de direitos básicos.
Como instrumento para facilitar a consecução desses objetivos, propõem a criação de uma Câmara de Relações de Trabalho, composta por entidades representativas dos empregadores, dos trabalhadores e dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
A Câmara de Relações de Trabalho terá como meta debater e propor as medidas necessárias para a reformulação do sistema de relações de trabalho, e, como ponto de partida para essa discussão, sugere-se o seguinte temário mínimo:
Temário
A. Direitos sociais do trabalho
- contrato de trabalho
- jornada de trabalho
- saúde e segurança no trabalho
- salário mínimo e formas de remuneração
- trabalho da mulher e do menor
- dispensa imotivada
- outros
B. Sistema de organização sindical
- liberdade e autonomia sindical
- convenções internacionais da OIT (87, 98, 151, 154)
- direito de greve/funcionamento de serviços essenciais
- garantias de representação e prática sindical
- sistema contributivo
- organização e representação no local de trabalho
C. Estrutura e sistema de negociações coletivas
- representação das partes
- instrumentos de contratação
- eficácia dos instrumentos de contratação
- cobertura da negociação coletiva
- direito à informação
- negociação coletiva no setor público
- obrigação à negociação
D. Sistema de solução de conflitos
- mediação e arbitragem
- poder normativo da Justiça do Trabalho
- representação classista na Justiça do Trabalho
- conflitos de direitos e de interesses
- substituto processual
- penalização por descumprimento -judicial e administrativa
E. Relação empresa e trabalhador
- participação nos resultados
- participação nos programas de qualidade
- participação nos programas de reestruturação
- participação nos programas de formação e requalificação profissional
F. Estratégia para a transição
- tratamento de direitos e expectativas de direitos
- prazos e garantias mútuas
- vigência dos convênios coletivos e da representação das entidades sindicais
- cobertura da legislação individual e coletiva durante o processo de transição.

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