São Paulo, domingo, 7 de maio de 1995
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'Matuto' considera o trabalho fácil

SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Preso há quase um ano com 2,5 kg de cocaína, que levava para o Rio, L. diz para a Folha que é um ``matuto". Mas não quer seu nome e área de atuação divulgados.
No processo em que é réu, nega ser traficante e sustenta que, por vingança, policiais forjaram um flagrante.
L. diz que por 13 anos viajou entre Bolívia e Rio. Afirma que o policiamento é deficiente e que seu negócio é lucrativo, mas não diz quanto, por temer sequestros.
Segundo L., a maior parte da droga é transportada por caminhoneiros, que a levam no meio da carga por R$ 2.000 ou R$ 3.000.
Folha - Como você virou ``matuto"?
L. - Era gerente da favela e acabei fazendo os contatos. Logo na primeira vez que fui a Santa Cruz (de la Sierra), com as indicações de quem já tinha ido resolvi tudo sem problema. Aí ficou fácil para voltar depois.
Folha - Com que frequência você ia à Bolívia?
L. - Dez, 12, até 15 vezes por ano. Dependia da quantidade que trazia. Se o pó durava mais, eu demorava mais a voltar.
Folha - Como trazia a droga?
L. - Quase tudo vinha de caminhão. Tem muito caminhoneiro que traz pó em troca de R$ 2.000, R$ 3.000. Às vezes eu trazia um pacote no carro, e foi aí que acabei preso. Quando tinha muito pó despachava umas ``mulas" (pessoas que trazem a droga) de ônibus mesmo.
Folha - E a fiscalização nas estradas?
L. - Eles (policiais rodoviários) só pegam quando alguém dedura. É muito difícil revistarem toda a carga. Em um caminhão grande, o que mais tem é esconderijo.
Folha - Você ia sozinho lá?
L. - Não. Ia sempre com uma namorada, que casal eles não param muito na estrada.
Folha - Quantas favelas você abastecia?
L. - Comecei no morro onde nasci, mas acabei procurado pelos amigos de uns morros perto. Antes de ser preso, entregava em três morros, mas sei quem leva para uns dez.
Folha - E o lucro?
L. - Quem conhece o assunto faz dinheiro.
Folha - Mas, pelo visto, a concorrência é grande.
L. - Quase todo o pó vendido nos morros chega com um ``matuto" que foi à Bolívia fazer negócio. Lá tem muito para vender e aqui tem muita gente para comprar. É fácil ganhar dinheiro.
Folha - Quanto se ganha?
L. - Ninguém gosta de ficar por aí dizendo quanto ganha. Ainda mais com esta onda de sequestros.

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