São Paulo, domingo, 7 de maio de 1995
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Direito dos médicos

ANTONIO CELSO NUNES NASSIF

A Secretaria de Acompanhamento Econômico está equivocada quanto à existência da Associação Médica Brasileira, o significado da sua Tabela de Honorários e o valor do CH. Isto tem conduzido seus responsáveis a tomarem atitudes que estão prejudicando aqueles que não merecem e ``premiando" os que, pela intermediação absurdamente lucrativa da saúde, precisam ser controlados e fiscalizados.
Elaborada e editada em 1984, a Tabela de Honorários da AMB simboliza para os médicos um passado de sonhos, conquistas, hombridade e dignidade. Ela é o resultado de um movimento da categoria que sacudiu esta nação, mostrando àqueles que até então exploravam o trabalho médico que a ``hora do basta" havia chegado.
Por isso, causa-nos perplexidade verificar que a Secretaria de Acompanhamento Econômico segue o mesmo caminho trilhado pelo governo Collor em 91, quando tentou induzir todos a uma concepção de que a Tabela da AMB se caracterizaria em ``prática de cartelização dos serviços médicos", ``que as decisões de fixação arbitrárias de preços, por parte da entidade, estavam sujeitas a enquadramento na lei nº 8158".
Ato recente, falando em nome do Ministério da Fazenda, o secretário de Acompanhamento Econômico, senhor José Milton Dallari Soares, cientificou as ``grandes empresas de planos de saúde e medicinas de grupo" de que ``considera o ato da AMB indevido, ilegal e abusivo, pois que contraria o que dispõe a legislação em vigor".
E continuou: ``Informo ainda, por oportuno, que o Ministério da Fazenda está representando contra a AMB, junto à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, por considerar lesivo à economia popular o procedimento da AMB".
Considerando que a situação atual é absolutamente idêntica àquela que vivemos em 91 e, para que o senhor Dallari possa conhecê-lo, reportamo-nos ao parecer do professor Walter Ceneviva, consultado na época, como conselheiro da OAB/SP, para opinar sobre a matéria. Vale reproduzi-lo em alguns trechos. Exarou sua opinião no sentido de que ``a orientação adotada pela Secretaria Nacional da Economia é gravemente inconstitucional e, lamentavelmente, levará o governo federal, ainda mais uma vez, a afrontar a Constituição Federal".
Apontou ainda o eminente professor como violados os artigos 5º, incisos XVII e XVIII, da Carta Magna, uma vez que a Secretária Nacional da Economia ``está pretendendo interferir diretamente no funcionamento da entidade associativa em assunto do típico interesse desta e de seus associados, como, aliás, dos médicos em geral, assunto para o qual ela tem legitimação, nos termos do art. 5, antes mencionado, em seu inciso XXI", ressaltando ainda ``que o art. 174 limita substancialmente as funções normativas do Estado, restringindo-as a meros indicativos no setor privado".
Prosseguiu o ínclito professor: ``A conduta agora adotada pela Secretaria Nacional da Economia parece pretender controlar o exercício da medicina, como se se tratasse de exploração da atividade econômica do Estado, delimitada pelo poder público até no atinente aos honorários de profissionais liberais".
E finalizou dizendo: ``As profissões liberais são livres da ação estatal, pela natureza mesma de sua independência, do relacionamento com a clientela, pelos elementos inerentes à confiança pessoal. Ainda assim não fosse, a atuação da Associação Médica Brasileira continuaria livre de qualquer intervenção estatal, pela legitimação que mencionei".
Há que se fazer entender, de uma vez por todas, que serviço médico não é mercadoria ``listável" para ser colocada à venda em ``supermercados". Da mesma forma, a interferência estatal, quando pretende transformar honorários em preços, constitui-se em notória ilegalidade e inconstitucionalidade.
Como se vê, não são os médicos que estão ``contrariando a legislação em vigor", mas sim o governo, que tenta impedi-los de lutar pelo direito de estabelecerem valores para seus serviços.

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