São Paulo, quarta-feira, 10 de maio de 1995 |
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Só se vê um filme com os próprios olhos
INÁCIO ARAUJO
A resposta já não interessa. O fato é que essa moça exprimia sua perplexidade num momento, os anos 60, em que em que se tornava corriqueiro entre nós o ritual de consultar os críticos antes de ir ao cinema. Se fosse possível dar uma resposta óbvia, ela seria: o cinema não é uma ciência, por isso é natural que as pessoas pensem coisas diferentes -até opostas- diante de um filme. Mas seu questionamento vai mais longe. O cinema e sua crítica até hoje suscitam paixões que não têm paralelo, digamos, na literatura. Os parâmetros para avaliar um escritor são infinitamente mais claros do que para julgar um cineasta. Gosta-se mais ou menos de Joyce ou de Proust. Mas suas virtudes estão de tal modo estampadas em seus textos que não podemos ignorá-las. No cinema, ao contrário, todas as tentativas de criar normas de como um filme deve ser tendem a se tornar ultrapassadas rapidamente. A importância dada pelos russos à montagem hoje parece tão arbitrária quanto as restrições de André Bazin à mesma montagem. Ninguém pode dizer que o certo seja empregar o ``foco forçado" de Gregg Toland ou não. Que o Hitchcock ``certo" está nos planos-sequência de ``Festim Diabólico" ou nos muitos planos em que Anthony Perkins retalha Janet Leigh em ``Psicose". No cinema, a fronteira entre essas duas instâncias é mais fluida que nas outras artes. O próprio fato de apresentar imagens ``reais" às vezes parece tornar irreconhecível aquilo que, paradoxalmente, se mostra em toda sua evidência. Daí a experiência do cinema ser mais íntima e a mais pública. Pede conversa, troca de idéias, o bar depois do filme, mas é de certa forma intransmissível. Integra a história, mas, de algum modo, a rejeita. Cria, com igual desenvoltura, o entendimento e o mal-entendido. A isso todos estão sujeitos. E talvez por isso o último dos conselhos dados por François Truffaut aos cineastss seja o mais importante: não aceite conselhos. Poderia ter acrescentado: mas escolha sua tribo. Este é, de algum modo, o subtexto desta lista. Só se vê um filme com os próprios olhos. Texto Anterior: CURIOSIDADES Próximo Texto: VIAGEM A TÓQUIO Índice |
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