São Paulo, sábado, 13 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Estabilização depende da política salarial

EDWARD J. AMADEO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Uma economia estabilizada tem inflação inferior a 10% ao ano. Com 3%, considerações sobre a inflação passam a ser praticamente desprezíveis em contratos anuais. Isto porque os riscos associados a erros de previsão são menores quando a inflação é baixa.
Quanto mais alta e volátil a inflação ou quanto mais longa a vigência de um contrato, maior risco de perdas associadas a erros de previsão. Mais importante passa a ser a expectativa inflacionária na fixação dos contratos.
Daí porque contratos longos exigem cláusulas de indexação que cubram eventuais erros de previsão. Os acordos de gatilho e antecipações salariais são exemplos.
Na ausência de regras de indexação, os custos do conflito na contratação ou o prêmio exigido pelo seguro contra o risco de perdas passam a ser muito altos.
Neste sentido, a indexação viabiliza contratos e transações que não existiriam ou cuja negociação seria muito complexa e custosa.
Pretende-se que a economia brasileira esteja em fase de transição para a estabilidade. Mas não é uma economia estabilizada e por isto não pode prescindir de mecanismos de indexação.
Hoje, a inflação é incompatível com ``desindexação", entendida como a eliminação dos mecanismos legais de indexação (TR, regras de indexação de aluguéis e salários).
A desindexação teria como consequência o crescimento dos conflitos entre partes negociantes nos diferentes mercados, de cláusulas informais de indexação e do prêmio contra o risco.
Além disto, geraria desintermediação ou redução do número de transações. Estes efeitos desorganizam os mercados e reduzem a eficiência.
A política salarial a partir de julho deve ser entendida como uma peça da engrenagem que facilitaria a estabilização. Note-se que é apenas uma peça. As políticas monetária, fiscal e cambial são circunstantes tão ou mais importantes.
O que se espera da política salarial? Que ofereça proteção aos salários face a movimentos imprevistos da inflação e que não seja incompatível com um eventual regime de inflação em queda.
Em ambos os casos, o foco das atenções é a inflação futura. Daí porque uma meta para a inflação futura deveria fazer parte da política salarial.
Se a meta fosse cumprida entre duas datas-base de uma categoria, não haveria redução imprevista dos salários.
Se não fosse cumprida, uma cláusula contratual daria aos sindicatos o direito de renegociar o salário até a data-base. Trata-se de um gatilho para a renegociação.
Há, entretanto, um terceiro objetivo, sem o qual a política salarial perderia eficácia. Qual seja, que o movimento sindical se comprometa com a política.
Pretende-se que a política salarial ofereça mecanismos de proteção aos salários que dispensem ações preventivas na forma de gatilhos e antecipações.
O que deseja o movimento sindical em troca da aderência à política salarial? As palavras-chave aqui são aderência e troca.
Aderência significa o compromisso das centrais sindicais de que não negociariam acordos que firam a política salarial.
Troca significa que o governo daria início à negociação de mudanças consideradas importantes para as centrais.
O contrato coletivo de trabalho, institutos legais de representação dos trabalhadores nas empresas, a derrogabilidade da CLT, o papel da Justiça do Trabalho, a pertinência do Imposto Sindical são temas de negociação.
Temas que interessam ao movimento sindical e deveriam interessar ao governo e ao setor patronal, porque se referem à revisão de um modelo extemporâneo de relações de trabalho.
Em síntese, a política salarial deve ser entendida como uma peça da transição no que se refere ao esforço de estabilização e à institucionalidade da relação trabalhista.

Texto Anterior: Governo quer desindexação total em 96
Próximo Texto: Política de juros altos dificulta as exportações do Brasil, diz Valentino
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.