São Paulo, domingo, 14 de maio de 1995
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Uma odisséia pela lírica grega moderna

A poesia de Paes estudou a anatomia dos epigramas gregos

AUGUSTO MASSI
ESPECIAL PARA A FOLHA

A tradução poética é sempre uma forma de eleição. Desde o final do século 19, assumiu o compromisso de ser uma leitura seduzida pela lâmpada da interpretação. Traduções, como as que Baudelaire realizou da obra de Poe, foram decisivas para os rumos da lírica moderna.
No Brasil, depois da inquestionável contribuição concretista, a tradução poética adquiriu a dimensão de tecnologia de ponta, laboratório de pesquisa que todo poeta jovem frequenta. José Paulo Paes, que certamente colaborou para várias destas conquistas, hoje, é um dos melhores tradutores que o país já teve. No entanto, julgo que sua contribuição seja de outra ordem.
Nos últimos anos, ele tem insistido com frequência na noção de modéstia. Não se trata da modesta grandeza de Manuel Bandeira. Quando Paes defende a literatura de entretenimento, quando escreve odes mínimas, quando chama os tradutores de ``modestos construtores do mundo", revela sua crença no trabalho miúdo, no esforço metódico e orgulhoso do aluno.
O poeta José Paulo Paes não procura o tom menor, afirmação de humildade tão natural em Bandeira. A sua poesia é simples porque estudou a anatomia dos epigramas, resíduos e meias palavras, que expressam a justa medida de sua cumplicidade: um por todos.
Munido de tal modéstia, já na idade madura começa a estudar o o grego moderno. Em vários ensaios, menciona uma mítica viagem à Grécia, sonho da juventude, realizado na vida adulta. Aproximou-se da língua grega adotando a visão do homem comum.
Sua odisséia tem início no final da década de 70. Em 1982, traz a público os primeiros frutos: ``Poemas", de Konstantinos Kaváfis (Nova Fronteira). Em dois anos, traduziu 73 dos 154 poemas do autor de ``À Espera dos Bárbaros". Em nossa língua só havia, anteriormente, a tradução do poeta e crítico português Jorge de Sena.
Quatro anos depois, aparece a antologia ``Poesia Moderna da Grécia" (Guanabara). O volume já reflete uma visada panorâmica e sistemática. Aqui, podemos descobrir a riqueza da experiência lírica grega, a poesia homérica de Níkos Kazantzákis (1883-1957), o conhecido romancista de ``Zorba, o Grego"; a dicção meditativa de Giórgos Seféris; o surrealismo libertário de Odisséas Elltis; a poesia civil de Yiánnis Ritsos; e o delicado penumbrismo de Kóstas Ouránis (1890-1953).
Dois anos depois, traduziu ``O Soldado" de Aléxis Zakythinós (1934), em plaquete da editora Escopo (Brasília). O autor pertence à geração do pós-guerra e foi embaixador da Grécia no Brasil.
Juntamente com Sarándis Andricópoulos e a poetisa Mándo Aravandinou, Aléxis forneceu material para que Paes traduzisse, em 1991, ``Poetas Gregos Contemporâneos" (Noa Noa). Através desta obra, nosso tradutor pode dar continuidade ao seu trabalho, oferecendo uma visão bastante representativa da poesia grega moderna.
Salvo algumas traduções avulsas, como a série de poemas de Ritsos publicados na "Novos Estudos Cebrap, a longa odisséia através da poesia grega moderna remontou às origens com a publicação dos ``Epigramas", de Paladas (Nova Alexandria), para finalmente retornar às ilhas poético-míticas de Seféris.

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