São Paulo, domingo, 14 de maio de 1995
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O Canadá do Sul

CLÓVIS ROSSI

BUENOS AIRES - Faz uns dez ou 12 anos, a embaixada brasileira em Buenos Aires ameaçou apresentar protesto formal junto ao governo argentino contra um conhecido humorista local, por tratar os brasileiros como ``macaquitos", um termo, de resto, utilizado com frequência pelo jornalismo esportivo argentino nas disputas com equipes brasileiras.
Era uma evidência do convencimento que os argentinos, como regra, tinham de que o Brasil era um país atrasado, incapaz de se equiparar à Argentina, européia, precocemente desenvolvida.
Hoje, essa história faz parte de um passado que parece muito mais distante. Os argentinos renderam-se às evidências. Evidência 1: pelo seu tamanho territorial e populacional, o Brasil estava condenado a, cedo ou tarde, equiparar-se à Argentina.
Evidência 2: o longo período de decadência argentina fez com que a equiparação se desse mais cedo do que tarde.
O governo Carlos Menem, de um pragmatismo absoluto, acentuou essa rendição. Seu chanceler, Guido di Tella, admite que a Argentina está destinada a ser uma espécie de Canadá do Sul. O Canadá também é muito rico e próspero, mas não pode competir com os Estados Unidos.
De fato, o Brasil começa a ser, para os argentinos, um ponto de referência tão frequente e, digamos, familiar quanto os EUA o são para o Canadá.
Na quinta-feira, em programa de entrevistas na TV, o entrevistador foi logo perguntando ao embaixador argentino no Brasil, Alieto Guadagni: ``Qué pasa con Eletrobrás y Petrobrás?".
Como se as duas estatais fossem lojinhas de esquina que todo argentino sabe onde ficam e o que fazem. No Brasil, nem o mais sofisticado programa de entrevistas perguntaria: ``O que acontece com a YPF?", a ex-estatal de petróleo argentina.
O problema agora é evitar que o racismo explícito mude de mão e os brasileiros passem a achar que os argentinos são o extremo Sul do Sul. Bobagem. Pelos indicadores sociais comparados, o vizinho do Norte ainda é um grandão bobo.

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