São Paulo, segunda-feira, 15 de maio de 1995
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Mercado de capitais e democracia

LUÍS NASSIF

Nos anos 60, o economista Ignácio Rangel já havia detectado o papel da inflação nos processos de superação da crise brasileira. O sistema de poder manietava a economia, estratificava interesses e dava sobrevida a setores economicamente anacrônicos (mas politicamente influentes).
As disfunções acumuladas geravam inflação, que permitia por vias tortas que novos grupos ocupassem o papel de motores dinâmicos da economia, sepultando o velho modelo falido.
Por falta de mecanismos modernos e de um ambiente competitivo, a superação de cada etapa da vida nacional exigia esforços gigantescos do país, num amplo desperdício de recursos, de empreendimentos e de bem-estar social.
O que ocorreu nos últimos 15 anos comprova a excepcional qualidade analítica dos trabalhos de Rangel.
No fim dos anos 70 fecha-se o ciclo da economia que teve início no pós-guerra. O modelo dos grandes investimentos -públicos e privados- coordenados e financiados com recursos públicos, chega ao fim.
Sendo enterrado
O modelo econômico morre, mas leva dez anos para ser enterrado. Indústrias que ainda conservam sua fatia de poder político socorrem-se do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), do crédito rural (se grandes produtores rurais) ou de incentivos regionais, como na Zona Franca de Manaus.
Estimulados pela inflação, os novos mecanismos financeiros, por seu lado, criam novo pólo dinâmico na economia, a partir de bancos tradicionais e dos novos grupos financeiros que surgiram nos anos 70.
Em 1990, com a abertura da economia, enterra-se definitivamente o velho modelo. Quebrado, o BNDES deixa de amparar os grupos tradicionais. Por seu lado, a desregulamentação da economia rompe com o aparato burocrático que, fechando a economia, garantia o poder dos grupos tradicionais.
Independentemente da selvageria com que se completou esse processo, tem-se agora todos os elementos para lançar definitivamente o país no caminho da modernização.
Numa ponta, há personagens modernos plenamente capitalizados -os bancos de negócios, os bancos tradicionais e os fundos de pensão, entre outros.
A oferta de recursos se ampliaria enormemente se se incluísse nesse bolo o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), para atuar como investidor da economia -não como financiador de empresas e de prefeituras, a juros irrisórios.
Na outra ponta, tem-se um vigoroso processo de reestruturação da economia brasileira, no âmbito das novas tecnologias e da globalização da economia.
Nó da história
O nó do processo é a falta de mecanismos que permitam juntar as duas pontas.
Os novos bancos de negócios passam a desempenhar papel de agentes de modernização, à medida que adquirem empresas, capitalizam-nas e profissionalizam sua gestão.
Mas, à falta de um mercado de capitais adequado e competitivo, sua expansão se dá às custas da desorganização de setores inteiros, por conta da falta de acesso a investimentos e a créditos civilizados.
No governo, o presidente da República é a pessoa com maior visão sobre a necessidade de se criar instrumentos descentralizados e flexíveis de modernização da economia.
Precisa se dar conta de que a criação de um mercado de capitais moderno é medida politicamente tão relevante quanto a implantação do federalismo na República.

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