São Paulo, segunda-feira, 15 de maio de 1995 |
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Loducca, jurado em Cannes, enfrenta momento de decisão
NELSON BLECHER
``Ilusão ou não, uma hora você quer se sentir dono do próprio nariz", diz Loducca, recostado na cadeira de vice-presidente da Foote, Cone & Belding, a agência que ocupa o prédio com formato de disco voador no Centro Empresarial de São Paulo (zona sul). ``Essa profissão é como a de jogador de futebol. É assustador o que acontece com alguns veteranos", acrescenta. ``Um dia, obviamente, vou ser superado". Quem está familiarizado com o frenético, instável planeta da propaganda há de concordar com os temores de Loducca, tentado a perseguir a trilha dos então ``golden boys" Washington Olivetto e Nizan Guanaes, que viraram a mesa para tocar negócios próprios. É chegado o momento de decisão também para Loducca. ``É mais difícil escrever um bom texto do que dirigir o negócio", diz Roberto Duailibi, sócio da agência DPZ, ao comentar o impasse. ``Riscos existem de ambos os lados, mas Loducca tem garra", afirma Duailibi. Nos bastidores do mercado intensificam-se os rumores de que ele já teria acertado uma sociedade com um grupo financeiro para fazer decolar no país a Lowe inglesa, que desde o ano passado busca parceiro no Brasil. A Lowe faz as campanhas da Mercedes-Benz e brindou os telespectadores no ano passado com aquele comercial genial da Smirnoff, em que objetos inanimados se transmutam em animais de sangue quente. Vinculada ao conglomerado mundial Interpublic, a agência conserva o poderoso artesanato criativo de uma legenda da propaganda: Frank Lowe, que preside em junho próximo o júri do Festival do Filme Publicitário de Cannes. Loducca é o jurado brasileiro. Sondagens e veneno Duas brasileiras da lista das dez mais demonstraram interesse no passe do publicitário, que também foi sondado pela BBDP francesa.``Ainda não fechei com ninguém", afirma e repete Loducca. Como participação acionária é quesito básico na agenda de negociação, o publicitário prossegue as conversas com a FCB -embora seja pouco provável que a matriz norte-americana abra um precedente para segurar um executivo latino-americano. O trunfo contábil com que conta Loducca, neste caso, é o aumento do faturamento, que saltou de US$ 45 milhões em 1992 para US$ 71 milhões em 1994. Desde sua contratação 15 clientes -do porte da General Electric e L'Oreal- entregaram contas publicitárias à FCB. Loducca faz questão de enfatizar essas informações de desempenho para refutar boatos viperinos difundidos no meio publicitário -``por alguém que conheço e ajudei no passado", diz ele- dando conta de que será demitido assim que retornar de Cannes. ``Loducca é um profissional com que qualquer boa agência gostaria de contar", diz Sergio Graciotti, da Graciotti & Associados. ``Espero que seu trabalho tenha sido bem compreendido". Estilo de novela Quem acha de gosto duvidoso o comercial humorístico da dona de casa que faz caretas no supermercado para provar ao marido que ainda é capaz de atrair homens, se espanta que tal campanha fez empinar as vendas da margarina Delícia até alcançar 32% de participação e ameaçar a liderança da concorrente Doriana. O vice-presidente porém, não se surpreende: ``Abandonamos a publicidade limitada às referências publicitárias e mergulhamos na cultura dos consumidores", diz. ``Com essa campanha revivemos a Família Trapo", acrescenta, ao citar o programa humorístico exibido pela TV Record nos anos 60. ``O país é teledramático". Há uma pitada de novela nos comerciais da FCB, como naquele de uma marca de tempero em que a mulher, à mesa do jantar, repete que a comida foi feita com amor e é interrompida pela empregada com um ``acabou o amor". Ou na série de comerciais em que uma mulher identifica no vestido e lenço de outra a cor ideal para a cortina de casa. Para frisar que a margarina Bem-Te-Vi é uma ``marca da terra" -comercializada somente no Nordeste-, consumidores paulistas e cariocas são desafiados a decifrar expressões regionais típicas. Sobre xaréu, uma espécie de peixe, diz um paulista com ar sério: ``É um perfume francês, o Channel número cinco." Em junho, Loducca fará um exercício semelhante. Parte rumo à Europa com a missão que se propôs de elucidar os colegas do júri de Cannes sobre peculiaridades da publicidade nacional. ``Somos sempre prejudicados nesses certames internacionais devido às grandes diferenças culturais", diz Loducca. Texto Anterior: De San Francisco para o fim da picada Próximo Texto: Pequenos crescem no setor de sorvetes Índice |
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