São Paulo, segunda-feira, 15 de maio de 1995
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Resultado dá força ao peronismo e destrói UCR

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL

Antes mesmo de iniciada a votação de 1995, começou a pré-campanha para o pleito presidencial de 1999.
O fato mais simbólico foi a presença no mesmo palanque dos governadores Eduardo Duhalde (Província de Buenos Aires) e Ramón ``Palito" Ortega (Tucumán).
Os dois são os principais pré-candidatos do peronismo à Presidência em 1999 e, por isso, estavam à beira do rompimento.
A necessidade de evitar um segundo turno fez com que o presidente Carlos Menem tratasse de somar todas as lideranças partidárias sem dispersões.
Ocorre que Menem pensa em voltar ao governo em 2003, já que uma segunda reeleição é vetada pela Constituição.
Para isso, obviamente, precisava ganhar agora e ainda apostar em uma gestão pelo menos razoável de seu sucessor.
A questão é saber se a unidade de fachada, na reta final de campanha, se manterá depois da eleição.
Duhalde tem uma vitrina natural, como governador da mais populosa Província argentina, na qual se concentram 8 milhões dos 22 milhões de eleitores.
Ortega, ao contrário, governa uma Província de apenas 759 mil eleitores. Seu prestígio deriva menos da ação política e mais de ter sido um cantor popular, uma espécie de Roberto Carlos com menos discos vendidos.
Agora, o cantor-governador pode ser chamado ao Ministério (Bem-Estar Social), uma forma de equilibrar a sua visibilidade com a de Duhalde.
Na oposição ao menemismo, José Octavio Bordón, na prática, fez este ano a sua campanha de 99. Era, até outubro, quando deixou o peronismo, a terceira das alternativas do partido.
Mas, sentindo-se sem espaço, aliou-se a outro dissidente peronista, o deputado Carlos ``Chacho" Álvarez, líder da centro-esquerdista Frente Grande (agora Frepaso).
A questão é saber se o crescimento de Bordón é sólido ou foi apenas o efeito de uma intenção de voto-castigo ao governo, na esteira da crise mexicana.
Isso porque a eleição de ontem trouxe um fato novo na política argentina: rompeu o bipartidarismo de fato que marcou a Argentina por meio século.
Nesse período, o peronismo e a UCR (União Cívica Radical, grupo centrista) levaram, juntos, no mínimo 70% e no máximo 94% dos votos nas seis eleições realmente democráticas realizadas.
O rompimento do bipartidarismo ocorre em prejuízo da UCR, o mais tradicional partido do país, com mais de cem anos de vida e seis vitórias em pleitos presidenciais desde a introdução do voto universal, em 1916.
O candidato do radicalismo, Horácio Massaccesi, fica em terceiro lugar, com uma votação provavelmente inferior ao mínimo histórico de 24%.
O fracasso do radicalismo tem sua raiz principal no governo de Raúl Alfonsín, o mais recente presidente eleito pelo partido (1983).
Foi justamente em seu governo que a Argentina enfrentou uma devastadora hiperinflação, justamente no ano da última eleição (1989).
Mas o radicalismo foi abalado também pelas disputas internas, a ponto de ter acabado por lançar um candidato difícil de carregar.
Massaccesi, governador da Província de Rio Negro, é jovem, pouco conhecido fora da Província e não lidera corrente alguma.
O desastre radical faz com que, na teoria, surja uma hegemonia peronista muito forte. Os dois principais candidatos de 1995 são de origem peronista -Menem e Bordón, que deixou o peronismo há apenas oito meses.
Na prática, entretanto, o peronismo perdeu sua face tradicional, tanto no ``menemismo" como no nascente ``bordonismo".
O peronismo surgiu como um movimento nacionalista, estatizante, populista. Hoje, o ``menemismo" é o seu inverso, a ponto de estar aliado a Álvaro Alsogaray, figura emblemática da direita.
Mas, por intermédio de Eduardo Duhalde, governador da Província de Buenos Aires, mantém uma prática assistencialista muito forte.
Já a Frepaso (Frente País Solidário) congrega desde os chamados ``peronistas renovadores" (mais centro-esquerdistas) até ex-radicais, passando por democratas-cristãos, esquerdistas sem partido e alguns conservadores.
No fundo, o resultado da eleição combina com um padrão que se vai tornando comum no resto do mundo: a dissolução da identidade partidária e a escolha apenas entre personalidades e não entre propostas essencialmente distintas.

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