São Paulo, terça-feira, 16 de maio de 1995
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'Casa de Orates' extrai humor do bater de portas

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Um autor que sabe fazer com que os personagens entrem e saiam.
Foi assim que Artur Azevedo se autodescreveu, em artigo de ``A Notícia", poucos anos depois de escrever ``Casa de Orates" com o irmão, Aluísio Azevedo. Era uma brincadeira do autor da obra-prima ``O Mambembe" com a sua capacidade de tirar graça do interminável bater de portas das comédias.
Uma capacidade de ``interessar o público e alegrá-lo, o que é mais difícil do que aborrecê-lo" -como ele escreveu com ironia característica no mesmo artigo, reproduzido no ``Teatro de Artur de Azevedo" editado por Antônio Martins de Araújo, em 1983. Para quem andou aborrecido com o teatro, e não foram poucos os aborrecimentos nestas últimas décadas, nada melhor do que Artur Azevedo.
``Casa de Orates", com o seu hilariante bater de portas, com a sua comédia de erros, está agora em cartaz no Teatro Aliança Francesa em espetáculo encenado por Brian Penido. Quem assistiu ``O Noviço", de Martins Pena, também encenada por Brian Penido, um ano atrás, vai perceber uma montagem de maior cuidado na produção e uma montagem, sobretudo, de maior desenvolvimento na interpretação -isso apesar do elenco carregado de atores jovens.
Começando da produção, o cenário de ``Casa de Orates" foi buscar para o palco uma imagem que é a própria essência do teatro de Artur Azevedo.
O dramaturgo que sabe fazer com que os personagens entrem e saiam ganhou uma cenografia toda ela de portas, de início três portas, depois desdobrando-se em sete, conforme a confusão se amplia. Uma cenografia engenhosa e realizada, se não com os recursos que exigiria, ao menos com cuidado.
Uma cenografia engenhosa para a engenhosa trama de Artur e Aluísio Azevedo, sobre a confusão crescente em torno da escolha de um marido para Júlia, a filha de um certo comendador Manuel e de Sinhazinha Mariana.
O comendador quer um homem de saúde perfeita, sua mulher quer um homem rico, e um terceiro pretendente surge no primo estúpido da jovem -mas Júlia acaba mesmo é por fugir com seu grande amor, um anêmico. Os dois se escondem numa clínica de repouso, ou de loucos, vindo daí o título, onde também vão parar os demais personagens, mais um médico, com sua mulher e depois sua amante.
A comédia dos erros se instala, e, para tais personagens e uma trama assim, Brian Penido retira dos atores uma interpretação, bastante adequada, de filme mudo -no que é auxiliado, informa o programa da peça, pela técnica circense de Alexandre Roit, um dos Parlapatões de ``Sardanapalo".
Uma interpretação que é reforçada pela maquiagem e até por uma dublagem, em certo momento. Uma interpretação de tipos exagerados, comicamente grotescos, de vaudeville.
Assim, o amor anêmico de Júlia, Roberto, que não tem um intérprete dos mais seguros em Henrique Pessoa, torna-se um dos personagens mais engraçados em função do físico do ator e de sua postura, dos seus gestos, do seu andar.
Os demais seguem uma linha caricata muito semelhante, alguns com melhor aproveitamento do humor próprio de Artur Azevedo, de sua ironia com as palavras, como no caso de Luiz Santos Bacelli, que faz o comendador Manuel.
Um humor popular, no enredo e no verbo. Um humor de quem sabe fazer com que os personagens entrem e saiam, para a delícia dos atores e do público. Um humor que já quiseram sufocar, por aqui, felizmente sem sucesso.

Título: Casa de Orates
Elenco: Fabiana Vajman, Paulo Diardini, Márcia Dib e outros
Quando: terça, às 15h e 21h, quarta, às 18h30
Onde: Teatro Aliança Francesa (r. Gal. Jardim, 182, tel. 011/259-0086)
Quanto: R$ 15

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